Uma em cada cinco famílias ucranianas enfrenta algum nível de insegurança alimentar grave, informou esta terça-feira (21) o diretor do Programa Alimentar Mundial (PAM) na Ucrânia, acrescentando que quanto maior a proximidade do campo de batalha, mais críticas serão essas necessidades.
Numa reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) para abordar os efeitos da guerra nas infraestruturas críticas e na segurança alimentar da Ucrânia, Matthew Hollingworth sublinhou que a guerra lançada pela Rússia continua a gerar insegurança alimentar dentro do país – que alimentava 400 milhões de pessoas em todo o mundo por ano antes da invasão russa.
“Neste momento, sabemos, através dos nossos inquéritos, que em 80% dos assentamentos próximos da linha da frente (dos combates), as pessoas enfrentam barreiras no acesso aos alimentos. (…) Mais de 900.000 pessoas que ainda vivem num raio de 30 quilómetros da linha da frente têm as necessidades de segurança alimentar mais agudas e graves – o que só piora no inverno”, disse o diretor do PAM, citado pela Lusa.
O PAM está a alimentar cerca de 750.000 destas pessoas com cestas de alimentos num momento em que as temperaturas estão a descer e, além disso, 1,5 milhões de pessoas com maiores necessidades receberão alguma forma de assistência monetária em áreas que foram diretamente afetadas pelo conflito, mas onde os mercados ainda funcionam.
Hollingworth não deixou de notar a “ironia” de que num país considerado “um dos celeiros mais formidáveis do mundo” – devido à sua elevada produção de cereais -, existam agora centenas de milhares de pessoas que dependem da assistência alimentar.
O diretor do PAM no país sublinhou que o impacto da guerra na agricultura ucraniana não se resume apenas aos “grandes números” de toneladas métricas que não foram produzidas ou aos cereais que não foram exportados, mas que se sente na vida quotidiana dos cidadãos ucranianos.
“Hoje, a guerra significa que os campos estão contaminados com minas e engenhos não detonados e as famílias não conseguem cultivar alimentos para se alimentarem. Aproximadamente, 174.000 quilómetros quadrados – cerca de 30% do território da Ucrânia – foram afetados pelo conflito e estão potencialmente contaminados por vestígios de guerra. Destes, 25.000 quilómetros quadrados são terras agrícolas”, afirmou Hollingworth.
Além disso, esta guerra também significou ataques às infraestruturas portuárias e de cereais, sendo que, desde meados de julho, foram registados 31 ataques contra instalações cruciais para a produção e exportação de cereais do país, salientou.
A par de dar resposta às graves e urgentes necessidades alimentares humanitárias que a população ucraniana enfrenta, os esforços de recuperação agrícola não podem ser esquecidos, defendeu o diretor do PAM, apontando que o país já sofreu 40,2 mil milhões de dólares (36,8 mil milhões de euros) em danos e perdas no setor agrícola.
“Juntamente com o resto das Nações Unidas, o PAM tem de trabalhar para garantir um mercado viável para os alimentos produzidos na Ucrânia. Caso contrário, não há incentivo para os agricultores cultivarem”, frisou.
Isto inclui trabalhar para “reduzir o enorme aumento dos custos logísticos criado por qualquer obstáculo à utilização dos portos do Mar Negro”, disse.
“Quando ocorrer a próxima crise alimentar, o mundo continuará a precisar da Ucrânia”, concluiu.
A reunião desta terça-feira foi convocada tela Albânia e pelos Estados Unidos, e contou ainda com o ‘briefing’ do secretário-geral adjunto da ONU para a Europa, Ásia Central e Américas, Miroslav Jenca, que disse que os ataques contra civis e infraestruturas civis ucranianas poderão aumentar ainda mais durante a próxima estação fria.
“O impacto para milhões de ucranianos será terrível à medida que se preparam para o segundo inverno de guerra”, afirmou.
Apelando à solidariedade e ao apoio internacionais durante o inverno, Jenca indicou que são urgentemente necessários 435 milhões de dólares (398,5 milhões de euros) para materiais de reparação de casas, roupas de inverno, aparelhos de aquecimento, combustível e reparações nos sistemas de água e aquecimento para 1,7 milhões de necessitados.
O secretário-geral adjunto assinalou ainda que a destruição causada ao país levará décadas para ser superada e está estimada em mais de 400 mil milhões de dólares (366,4 mil milhões de euros).