Psicologia-Nutrição: Aliados no tratamento das Perturbações do Comportamento Alimentar (Parte I) 13620

A complexidade inerente às Perturbações do Comportamento Alimentar (PCA) manifesta-se num tratamento equitativamente intricado. O processo tende a ser angustiante e assimétrico e os sintomas atravessam âmbitos clínicos diversos, desde alterações biológicas a manifestações somáticas, psicológicas e comportamentais. Assim, é imprescindível que o tratamento ocorra num ambiente íntegro, empático e cauteloso. O objetivo deve ser o incremento do bem-estar do indivíduo através da melhoria da saúde física, cognitiva, emocional e espiritual.

Pelo exposto, o tratamento deve ser mediado por uma equipa multidisciplinar que, idealmente, contemple médicos, enfermeiros, psiquiatras, psicólogos e nutricionistas. O contacto com esta população requer treino avançado, podendo emergir da combinação de estudo autodidata, educação contínua e supervisão com profissionais com experiência na área. Contudo, a nível nacional e especialmente em certas áreas geográficas, não é exequível reunir um conjunto de profissionais que possua instrução específica, sendo sempre imposto o delineamento da estratégia de intervenção mais adequada à individualidade do caso. Não obstante, a formação é essencial no reconhecimento da complexidade e necessidade a longo termo de compromisso para a obtenção de resultados de sucesso e sustentáveis da intervenção.

A relação entre a Psicologia e a Nutrição patenteia-se no facto de a alimentação ser uma componente primária do ser humano e constituir um contributo primordial para o seu bem-estar. No seio do tratamento das PCA, a conexão estreita-se, visto que as atitudes e emoções associadas à alimentação podem igualmente ser nocivas. Apesar de a maioria ser benigna, a presença de comportamentos desordenados detém implicações que elevam o risco de desenvolvimento de patologia. De facto, o seu despoletar depende de predisposições individuais e de fatores de risco interpessoais, causando um desajuste na relação com a alimentação.

Neste sentido, a psicoterapia é peça central no tratamento das PCA; sendo as mais difundidas neste âmbito: cognitivo-comportamental; psicodinâmica; interpessoal; familiar; e de grupo. Consoante a patologia, o contrato terapêutico expressa-se distintamente. A indicação de uma corrente psicológica específica que garanta a diminuição de sintomas ou a renunciação da doença não parece prudente. Antes, deve estimular-se o paciente a envolver-se no processo, enquanto se investiga qual a psicoterapia que melhor se adapta a si e a qual tem acesso. Além disso, a história de vida, resposta ao tratamento, severidade dos sintomas, existência de comorbidades e risco de complicações médicas devem ser ponderadas.

Por sua vez, a relevância da reabilitação nutricional é inegável. No entanto, a sua concretização é inconsistente, dado que, na prática, é exercida por um espectro variado de profissionais de saúde; desde médicos, psicólogos cognitivo-comportamentais até a encarregados legais dos pacientes. Ainda assim, atualmente, a tendência parece ser a transferência para nutricionista, que assiste na monitorização do peso, eletrólitos, sinais vitais, ingestão nutricional e comportamentos alimentares. A base desta atuação prende-se com a educação nutricional, planeamento alimentar, desencorajamento de dieta e estabelecimento de padrões alimentares regulares.

Em suma, parece evidente que, comparativamente aos restantes membros da equipa multidisciplinar, os psicólogos e os nutricionistas posicionam-se em patamares únicos perante o “universo alimentar” dos pacientes, que engloba não só os alimentos que consomem, mas também as crenças e emoções associadas. Ilustrando, acedem a alergias alimentares, regras alimentares, padrões alimentares, preferências e evitamentos alimentares, castigos associados à alimentação, prazer, indulgência, vergonha e culpa. Posto isto, estes profissionais possuem um papel primordial na recuperação da relação do indivíduo com a alimentação, devendo trabalhar conjuntamente para esse fim.

João Romeiro
Psicólogo Clínico