Pompe – Os raros que têm pressa 218

Joaquim Brites – Presidente APN – Associação Portuguesa de Neuromusculares

A inovação dos últimos anos introduziu na comunidade das doenças raras algumas mudanças no que respeita a terminologias e a conceitos. Sobre as novas terminologias, habituámo-nos à frequência com que ouvimos falar de novos medicamentos destinados a tratar algumas patologias que, até há algum tempo, eram consideradas estranhas e das quais pouco se falava. O termo “terapia genética”, ou a nova capacidade de utilizar genes para tratar doenças e modificar a sua evolução, passou, também, a ser muito utilizado nos nossos dias. Neste domínio, algumas novidades chegarão ao nosso conhecimento nos próximos anos, pela velocidade com que a tecnologia e a nova inteligência nos permitem sonhar.

Mas, os conceitos a que me refiro, conseguem adulterar a nossa visão sobre o seu verdadeiro significado. Por exemplo, a conceção que todos temos sobre equidade, quando nos referimos à saúde, leva-nos a pensar que temos o direito de viver numa sociedade na qual todos somos iguais e com os mesmos direitos. Na realidade, algumas pessoas atingidas por alguns tipos de doenças mais raras ou mais difíceis de diagnosticar, diagnosticadas tardiamente ou de forma atempada, não veem os seus direitos à equidade postos em prática. Que o digam os doentes de Pompe, que assinalam anualmente o Dia Mundial da sua Doença neste dia 15 de abril.

Trata-se de uma doença neuromuscular, lisossómica, rara, pode dizer-se muito rara já que a sua taxa de prevalência se situa em um caso para cada 40.000 pessoas. Afeta os dois sexos, pode ser diagnosticada em qualquer idade e os seus portadores apresentam um defeito no gene GAA que é responsável pela produção de uma proteína, a enzima alfa-glucosidase ácida, cuja função é quebrar o glicogénio que é uma forma de açúcar e que está armazenada nas células dos músculos de todo o corpo. Na doença de Pompe, esta enzima está pouco presente ou, mesmo, totalmente ausente. Por essa razão, estes doentes têm necessidade de recorrer ao único tratamento prolongado que está disponível, que consiste na reposição enzimática. Este, é efetuado em ambiente hospitalar e em intervalos de tempo bem determinados.

Ao fim de alguns anos de experiência, e de alguns resultados positivos, a investigação e a inovação voltaram a marcar presença na vida destas pessoas, alimentando-lhes a esperança de um futuro menos sofrível e de uma expetativa de vida menos dependente. Com o aparecimento de duas promissoras alternativas terapêuticas, provenientes de laboratórios farmacêuticos distintos, estes doentes acreditam, agora, que após a aprovação de todos os processos burocráticos e de alguns, mais do que certos e previsíveis, constrangimentos financeiros, seja possível que o conceito de urgente, porque necessário à urgente melhoria da sua qualidade de vida, possa ser aplicado a toda a apreciação farmacoterapêutica e farmacoeconómica que antecede a decisão das entidades reguladoras de cada país, para que o seu tratamento efetivo possa começar sem entraves.

É necessário, portanto, que sejam urgentemente introduzidas na cadeia das novas terapias para as doenças raras, como a doença de Pompe, e da sua aprovação, as terminologias certas para que as pessoas não desesperem. Ação, urgência, prioridade, transformação do sistema e a correção das assimetrias, são apenas alguns dos termos que precisamos de começar a ouvir mais frequentemente. Justiça, acesso, sensibilidade, aprovação das novas tecnologias em saúde, entre outros, são, também, alguns dos conceitos que precisamos de valorizar mais.

Neste início de mandato do novo Governo, bem sei que serão muitas as prioridades com que está confrontado. O desafio é que saiba defini-las pela ordem certa.
A bem de todas as pessoas que também não querem ficar para trás.