Pode a microbiota intestinal ajudar na personalização da perda de peso? 1266

O excesso de peso não é apenas uma questão de estética ou autoestima, mas está fortemente associado ao aumento do risco de desenvolver doenças crónicas como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, esteatose hepática (fígado gordo) e até certos tipos de cancro. Na União Europeia, estima-se que cerca de 50% da população adulta esteja classificada como tendo excesso de peso ou obesidade.

Não se deve subestimar a gravidade da obesidade. Trata-se de uma doença metabólica crónica, caracterizada pela acumulação excessiva de gordura corporal que, a longo prazo, representa um risco importante para a saúde. Geralmente, resulta de um desequilíbrio entre a ingestão e o gasto energético, sendo que hábitos alimentares inadequados e um estilo de vida sedentário contribuem significativamente para a sua incidência. No entanto, os tratamentos convencionais baseados em dietas de baixo teor calórico e aumento da atividade física costumam ter baixa adesão. Desta forma, há um número crescente de estudos científicos dedicados a identificar marcadores precoces de obesidade, visando desenvolver tratamentos personalizados e intervenções mais eficazes. No sentido de fazer frente a esses desafios, a ciência tem procurado novas abordagens, e a microbiota intestinal emergiu como uma potencial aliada na personalização da perda de peso.

No combate à obesidade, a microbiota intestinal – o conjunto de microorganismos que habitam o nosso sistema digestivo – tem sido alvo de grande interesse. Indivíduos com obesidade, de maneira geral, apresentam uma microbiota reduzida e menos diversa, maior permeabilidade intestinal e uma produção alterada de metabolitos. Esta condição está associada a uma maior produção de mediadores pró-inflamatórios que, ao entrarem na corrente sanguínea, promovem um estado inflamatório característico da obesidade.

Estudos indicam que quanto maior o índice de massa corporal (IMC), menor é a diversidade e a riqueza da microbiota intestinal. Também foram observadas mudanças nos níveis de ácidos gordos de cadeia curta, produzidos pela microbiota, relacionados com a abundância de microrganismos do grupo Proteobacteria.

Isto significa que, analisando a microbiota intestinal, é possível identificar quem está em maior risco de sofrer de obesidade? Parece que sim. Um dos objetivos científicos atuais é desenvolver ferramentas preditivas que facilitem a nutrição personalizada para prevenir e tratar a obesidade.

A composição da microbiota intestinal depende em grande parte da nossa alimentação. Por exemplo, sabe-se que uma dieta rica em fibras ou amido resistente (não digerível) pode, em apenas quatro semanas, produzir mudanças significativas na composição da microbiota e na produção de metabolitos. Contudo, esses efeitos são menores em pessoas com maior diversidade microbiana inicial.

Para indivíduos com obesidade que seguem dietas de emagrecimento, os benefícios dependem parcialmente da abundância da bactéria Akkermansia muciniphila. Pessoas com uma comunidade rica desta bactéria perdem mais peso, mesmo consumindo a mesma quantidade de alimentos, do que aquelas com uma representação menor deste microorganismo.

Além disso, a presença das bactérias Prevotella copri e Blastocystis spp. está associada a melhores níveis de glicose no sangue após as refeições. Bactérias como Bacteroides fragilis, Clostridium leptum e Bifidobacterium catenulatum são preditoras de uma perda de peso mais eficaz em dietas hipocalóricas combinadas com atividade física.

Conhecer a composição da microbiota de um indivíduo e combinar essa informação com outras características (como o perfil genético) permitirá prever a eficácia da resposta a um tratamento de intervenção para a obesidade. Atualmente, com apoio de tecnologia, é possível desenvolver algoritmos e modelos avançados que permitem compreender melhor a relação entre a microbiota, a dieta e a obesidade, indicando que microrganismos sinalizam a eficácia de uma dieta específica antes mesmo de começar o tratamento.

Em resumo, a microbiota intestinal não só influencia o desenvolvimento da obesidade, mas também pode servir como um indicador para identificar quem tem maior risco e para prescrever uma intervenção nutricional personalizada. Esta aplicação pode ser muito interessante em vários aspetos. Por exemplo, quando aplicada em crianças, pode ajudar a reverter a crescente tendência de obesidade infantil, identificar crianças com alto risco de obesidade e prevenir maiores problemas em sua vida adulta.

Além disso, a formação e o conhecimento dos profissionais de saúde serão essenciais para integrar estas novas metodologias de informação e aplicá-las eficazmente na prática clínica. A ciência da microbiota intestinal está apenas a começar a desvendar o seu potencial, e os próximos anos prometem avanços significativos na área, trazendo esperança para milhões de pessoas em todo o mundo.

Amanda Cuevas, PhD, Institute IMDEA Food – Research Institute of Food and Health Sciences, Madrid, Spain
Marta P Silvestre, PhD, NOVA Medical School, Universidade NOVA de Lisboa