Nutricionistas de Férias 617

Se há profissões que vivem de uma certa sazonalidade, a de Nutricionista é seguramente uma delas. Depois do pico de trabalho no período entre a Páscoa e as Férias de Verão, é tempo de também nós recarregarmos energias e, por que não, cometermos os nossos próprios excessos – de preferência sem nenhum paciente a ver!

Agosto é tempo para relaxar, estar com os amigos e partilhar aquelas estórias que só a nós nos acontecem… Numa tarde de praia ou numa jantarada de verão, quem nunca relembrou aqueles utentes que tornam as nossas consultas especiais?

Comecemos pelos que nunca chegam a horas! Há aqueles a quem acontece sempre qualquer coisa (um acidente, uma fila de trânsito inesperada, uma reunião que se atrasou) que os impede sistematicamente de chegar no horário da consulta. E há também os que se atrasam porque “as consultas nunca começam à hora marcada”, numa lógica de mais vale deixar os outros à espera do que chegar a horas e por acaso ter de esperar 5 ou 10 minutos. A pontualidade não é uma das virtudes dos portugueses e se as consultas médicas muitas vezes se atrasam, as culpas bem se podem distribuir por ambas as partes…

Já na consulta, recordemos, agora que estamos de férias e bem-dispostos, aqueles que entram porta adentro e já sabem tudo! Verdadeiros especialistas em dietas, contrapõem toda e qualquer indicação que possamos tentar dar – “isso comigo não funciona” ou “mas eu já faço isso!” não são boas notícias e significam trabalhos redobrados para qualquer Nutricionista… Mas já não é mau quando chegamos a esta parte da consulta! Há utentes que começam logo a interromper-nos quando ainda estamos a tentar fazer o levantamento dos fatores que podem influenciar a variação do peso ou exigir cuidados específicos com a alimentação. O “metabolismo lento” ou “os alimentos que engordam” perseguem estas pessoas e do Nutricionista espera-se, qual exorcista, que resolva este problema sem demora!

E que dizer daqueles que aparecem nas consultas de seguimento iguais ou piores que na consulta anterior? À frustração de não termos conseguido ajudar alguém em algo tão importante como perder peso, junta-se a escuta atenta de um chorrilho de justificações – “porque tive muito trabalho”, “porque estive de férias”, “porque só fiz isto” ou “porque não fiz aquilo”. Como seria bom se conseguíssemos que estas pessoas se ouvissem a si próprias e com isso ganhassem mais consciência que, de facto, perder peso é muitas vezes difícil e só com dedicação se conseguem resultados saudáveis e duradouros. Como seria bom que percebessem que a sua perda de peso não depende apenas da ida ao Nutricionista, mas sobretudo daquilo que conseguem fazer no seu quotidiano.

Brincadeiras à parte, aproveitemos então o sol, a praia e a distância do trabalho para refletir um pouco na nossa prática e naquilo que podemos melhorar em nós próprios. Claro que é mais fácil apontar o dedo aos outros, mas porque não pensar naquilo que podemos fazer diferente e melhor quando voltarmos à consulta em setembro? Se é certo que há utentes mais difíceis, e alguns mesmo que talvez nunca conseguiremos ajudar, também é verdade que podemos usar estas histórias para nos aperfeiçoarmos e prestarmos um serviço cada vez melhor! Afinal de contas, melhor do que qualquer uma destas histórias, só mesmo as histórias de sucesso daqueles que conseguimos ajudar rumo a uma vida mais saudável!

Rodrigo Abreu,

Nutricionista