Aparentemente saudável 1153

Recentemente, na sequência de um artigo sobre alimentação saudável que escrevi para uma revista, foi-me pedido pela jornalista que indicasse algumas sugestões de imagens que pudessem ilustrar o texto. Após uma pesquisa rápida na net, enviei, a título de exemplo, algumas imagens com cabazes de variados produtos alimentares: pescado, azeite, verduras e fruta. Presumi que as sugestões enviadas fossem bem recebidas (pesquisei por “dieta mediterrânica”), pelo fiquei surpreendido com a resposta desiludida da jornalista. “Tinha pensado em algo mais clean, algo mesmo saudável” disse-me ela. Após alguma troca de impressões, percebi que a sua ideia era usar um grande plano de uma alface, fresca e com gotículas de água. Ainda argumentei que se o texto era sobre alimentação, faria mais sentido apresentar vários alimentos, em vez de apenas um. Mas a senhora não parecia muito convencida…

De facto, as alfaces gozam de uma ótima reputação quando se trata de alimentação saudável. Se estou num jantar de amigos e alguém pergunta como perder peso, logo surgem as sugestões dos leigos no assunto: “tens de comer mais alface!”. E em consulta, tantas vezes oiço pessoas lamuriarem-se de que nunca irão perder peso porque não gostam de alface. Talvez pelo seu reduzido valor calórico, generalizou-se a ideia de que a alface, assim como outros alimentos de baixa densidade energética, é uma mais valia para perder peso e, consequentemente, é saudável. Mas se é verdade que uma alface tem poucas calorias, também é um facto que apresenta poucos nutrientes. Algum caroteno e potássio talvez não sejam suficientes quando pensamos em benefícios para a saúde. Por outro lado, e há sempre um outro lado quando falamos de alimentação, para um alimento ser “saudável” devemos considerar não só os aspetos nutricionais, mas também fatores como a possível presença de contaminantes (pesticidas ou fertilizantes, por exemplo) ou as variações de composição conforme a sua produção.

Não sendo este texto sobre a alface, serve este exemplo para nos fazer pensar sobre aquilo que tendemos a rotular como “saudável”. Limitar a análise de um alimento às suas calorias, é sem dúvida redutor. E pensar que uma alimentação saudável é apenas um catálogo de “alimentos saudáveis”, retira o sentido àquilo que é o ato de comer. É no conjunto das escolhas, e não apenas nas “peças” que as constituem, que está a chave para uma melhor alimentação.

Por isso, foi com muita satisfação que vi uma foto bonita com vários dos alimentos típicos da dieta mediterrânica a acompanhar as linhas que escrevi sobre alimentação saudável. Felizmente, a jornalista também entendeu que não podemos falar verdadeiramente de alimentação saudável se estivermos apenas a olhar para um grupo reduzido de alimentos, que catalogamos como benéficos porque nos ajudam a perder peso,

Rodrigo Abreu,
Nutricionista