Após a última crónica, recebi diversas mensagens sobre a terminologia a usar para designar a pessoa que sofre de obesidade. Como o espaço para cada texto é limitado, volto este mês ao assunto para completar a reflexão, que é aliás pertinente. Se no mês passado abordámos os riscos de nos debruçarmos sobre a doença em vez de considerarmos a pessoa, a questão que se coloca agora é como designar o indivíduo com muita gordura corporal: Obeso? Pessoa com obesidade? A terminologia pode parecer algo de somenos importância, mas na realidade a forma como designamos as pessoas é bastante relevante. Veja-se por exemplo a evolução em torno da designação “Cliente” no âmbito das consultas de nutrição. Para quem trabalha num hospital, as expressões mais comuns são “doente” ou “paciente”. Para quem faz clínica privada, “cliente” parece ser mais adequado, pois muitos dos que se dirigem à consulta não estão doentes nem sofrem de nenhuma patologia, mas todos pagam um serviço. “Utentes”, no sentido literal daquele que utiliza a consulta ou serviço de acompanhamento nutricional, poderá ser a expressão mais consensual, uma vez que não se limita a pessoas com doença, nem a pessoas com relação comercial entre si e o nutricionista… De modo ainda mais importante, chamar obeso a alguém (ainda que correto do ponto de vista clínico, para alguém com um IMC igual ou superior a 30), levanta questões do ponto de vista da estigmatização destas pessoas. Afinal, é-se obeso ou está-se obeso? Considerando que a doença não define o indivíduo e considerando ainda que a doença pode não ter um caráter permanente na vida dessa pessoa, qual a terminologia a utilizar? Várias entidades e sociedades internacionais têm-se debruçado sobre o tema, não só em relação à obesidade, mas também a outras patologias. Há um consenso relativamente amplo de que a designação “obeso” tende a catalogar e “prender” a pessoa numa determinada condição. A somar a esta questão de princípio, não é de menosprezar o impacto que tratar alguém por “obeso” pode ter na sua autoestima e motivação. Este é um ponto fundamental, uma vez que a obesidade se desenvolve por uma conjugação de fatores, onde se incluem os comportamentais. Por último, que dizer dos dados que nos mostram uma crescente estigmatização sofrida pelas pessoas com peso excessivo, desde a escola ao local de trabalho, passando até pelos próprios prestadores de cuidados de saúde? Por todas estas razões, a maioria das indicações internacionais sobre este tema, aconselha o uso da expressão “pessoa com obesidade”, precisamente como forma de colocar o enfoque na pessoa. De que forma então se podem aplicar estas considerações na nossa prática? Devemos fugir da palavra “obeso”, com receio de ofender ou estigmatizar alguém? Não havendo seguramente uma resposta única para todas as ocasiões, parece claro que o contexto determinará o que é mais adequado. Por exemplo, não parece viável que em consulta, depois de o utente sair da balança, nos dirijamos a ele dizendo: “o senhor é uma pessoa com obesidade”. Pelo contrário, expressões como “este peso corresponde a obesidade” ou “com este peso, o senhor está obeso” continuam a alertar para os riscos da condição, sem catalogar ou injuriar ninguém. Se, como vimos anteriormente, o nosso foco deve estar em conseguir ajudar quem sofre de obesidade, medir as palavras que usamos no trato com estas pessoas deve ser seguramente um dos primeiros cuidados a ter!
Rodrigo Abreu, |