Criado em 1981 pela FAO, o Dia Mundial da Alimentação tem servido para pôr na agenda diversos assuntos relacionados com a alimentação, que vão da nutrição à sustentabilidade, passando pela agricultura. Como nutricionista, 16 de outubro é sempre sinónimo de mais trabalho: entrevistas a meios de comunicação social, ações de sensibilização em escolas, workshops em empresas. Todos os anos por altura da celebração desta data parece haver interesse pelo assunto, mas ao fim de todos estes anos, o que se pode acrescentar ou dizer de novo sobre a nossa alimentação, que seja relevante? Há uns anos atrás (no princípio do milénio) a tónica nos discursos do Dia Mundial da Alimentação assentava na noção de variedade e equilíbrio. A obesidade já era uma questão na agenda da saúde pública e um pouco por todo o mundo, o tema era centro de debate e reflexão. Afinal, a OMS tinha declarado a obesidade como a grande pandemia do século XXI, considerando-a uma “doença social e ambiental” (entre 1995 e 2000 o número estimado de obesos no planeta aumentou em cerca de 100 milhões). Neste cenário, em 2005, a Declaração de Giessen marca aquilo que se pretendia ser um ponto de viragem, referindo que era tempo de reformular a ciência em torno da nutrição de modo a incluir as dimensões sociais, ambientais e biológicas. Sublinhava-se a importância de a nutrição incluir o estudo dos sistemas alimentares e do ambiente, para que se pudessem adotar políticas alimentares e nutricionais integradas. É por isso que, uma década depois, não posso deixar de sentir um certo desapontamento perante a proliferação de mensagens simplistas do tipo “alimentos que engordam”, “superalimentos que emagrecem” ou dietas que resolvem tudo. Pressionada pelo aumento rápido da obesidade, a OMS assumiu como missão a este respeito “tornar as escolhas saudáveis as escolhas mais fáceis”. A intenção é boa, mas estaremos a conseguir transmitir mensagens simples (não simplistas), fáceis de adotar e que sejam válidas? Talvez seja tempo de voltarmos um pouco atrás e relembrar a Declaração de Giessen. A começar, desde logo, pela própria epidemiologia nutricional. É muito difícil separar a Alimentação da Pessoa e é impossível separar a Pessoa da Sociedade. De facto, o contexto socioeconómico molda a maioria das nossas escolhas alimentares e há fatores motivacionais que determinam muito o que comemos. Claramente, parece ser necessário pôr o foco da investigação não apenas em determinados alimentos ou nutrientes, mas sim em padrões alimentares. Como num jogo de xadrez, em que a movimentação de determinada peça pode desencadear uma série de movimentos por parte do adversário, também quando intervimos a nível alimentar ou nutricional devemos considerar as repercussões dessas ações. Por exemplo, incentivar o consumo de um determinado alimento devido ao seu perfil nutricional, pode aumentar muito a sua procura e gerar desequilíbrios na forma como é produzido, afetando o ambiente ou populações. Do mesmo modo, diabolizar certos alimentos pode gerar fenómenos de transferência de consumo em que, para fugir destas escolhas, os consumidores acabam empurrados para outras que podem revelar-se ainda piores ou menos adequadas. Por tudo isto, assistiremos a pressões cada vez maiores para darmos resposta a estes problemas e, em simultâneo, para nos afirmarmos como os profissionais de referência nesta área. Não será fácil, sobretudo se não aparecerem resultados no combate à obesidade. Aproveitemos então mais um Dia Mundial da Alimentação para refletir como podemos ser, de facto, relevantes! Rodrigo Abreu, |