A porta-voz do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), Inês Sousa Real, propôs “segundas-feiras sem carne” na Assembleia da República e o ministro da Agricultura convidou a deputada a comer uma francesinha como sinal de “tolerância”. Por sua vez, o nutricionista Pedro Graça pede estratégia nacional “e menos soud bite”.
O PAN defende que o Parlamento conte com um dia exclusivamente vegetariano por semana, como “exemplo positivo de compromisso com a sustentabilidade e a redução da pegada carbónica”. O projeto de resolução do partido aponta o “impacto significativo das escolhas alimentares na emissão de gases com efeito de estufa”.
Em resposta a esta proposta, o ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, acusou o partido de querer “impor” estas refeições na Assembleia e saiu em defesa da “liberdade de escolha, informada e esclarecida”. O responsável deixou uma questão no ar na rede social X: “será que vão propor um dia dedicado exclusivamente a pratos de carne de raças autóctones ou pescado nacional?”.
A estas declarações, de 2 de novembro, juntou-se uma proposta endereçada a Inês Sousa Real, nesta terça-feira, numa audição parlamentar com as comissões de Orçamento, Finanças e Administração Pública e Agricultura. O ministro mostrou-se disponível para a opção vegetariana, mas lançou uma contraproposta.
“Eu sou um moderado e defensor da biodiversidade. Se todos passássemos a uma dieta vegan, não acha que isso tinha implicações?”, questionou José Manuel Fernandes. O ministro mostrou-se disponível para comer uma francesinha sem carne com Inês Sousa Real, mas convidou a deputada a juntar-se para uma “francesinha de carne barrosã”. A porta-voz do PAN recusou a proposta, acenando com a cabeça.
O Ministro da Agricultura @JMFernandesEU , aceitou o desafio e provar uma francesinha vegetariana!
Já eu terei de declinar o convite deixado pelo Sr. Ministro… Se as raças podem estar em risco de extinção, comê-las não será certamente a melhor estratégia de preservação! 🤷♀️ pic.twitter.com/pPh5HLSxgI— Inês Sousa Real (@InesSousaReal) November 5, 2024
“Se as raças podem estar em risco de extinção, comê-las não será certamente a melhor estratégia de prevenção”, escreveu Inês Sousa Real, também na rede social X.
“Provocação gratuita resolve pouca coisa”
O nutricionista e diretor da Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto (FCNAUP) reagiu à picardia. “Não sou vegetariano, mas defendo, como a maioria da comunidade científica internacional e dos meus colegas nutricionistas a necessidade de reduzirmos bastante o consumo de carne, em particular de carne bovina e aumentar o consumo diário de produtos de origem vegetal”, escreveu Pedro Graça no LinkedIn.
O Nutricionista do Ano nos Prémios VIVER SAUDÁVEL de 2022, que já foi a cara do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável da Direção-Geral da Saúde (DGS), apontou a necessidade “de uma discussão multidisciplinar, urgente, profunda e séria sobre este tema”.
Para Pedro Graça, o país necessita de uma “estratégia nacional transparente com metas a curto e médio prazo para esta redução [do consumo de carne] e menos sound bite e provocação gratuita que resolve pouca coisa”.
“Água em excesso faz mal”
José Manuel Fernandes esteve sob crítica em finais de outubro por ter dito que “o consumo de vinho de forma moderada não faz mal” e que, por outro lado, “a água em excesso faz mal”, pelo que “tem de existir moderação”. O governante, em entrevista à TSF, referiu que há regiões em Portugal “onde a longevidade é maior onde [os cidadãos] bebem tinto verde”, uma afirmação desmentida por especialistas.
Na altura, Pedro Graça também se havia manifestado para “colocar a ciência como base da discussão pública e dar voz à nossa opinião como profissionais comprometidos com a saúde dos outros, independentemente das cores políticas e dos interesses comerciais ou vantagens económicas de ocasião”.