ONG que ajuda a alimentar favela carioca acolhe G20 e apela a líderes que acabem com fome 555

A organização não-governamental Ação da Cidadania acolhe na sua sede no Rio de Janeiro várias reuniões do G20 e espera sensibilizar as maiores economias mundiais a embarcarem numa aliança contra a fome, porque “quem tem fome tem pressa”, sublinha.

Desde segunda-feira e até sexta-feira, o Galpão da Cidadania, na Zona Central da cidade do Rio de Janeiro, acolhe os responsáveis das 20 maiores economias do mundo e observadores do grupo, como Portugal, numa série de reuniões entre as quais o lançamento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que será anunciada na quarta-feira, e liderada pelo Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e na qual se espera recolher o máximo de apoio possível.

O local, com vista para a mais antiga favela do Brasil, o Morro da Providência, não foi escolhido por acaso: fundada há 31 anos pelo sociólogo Herbert de Souza, conhecido por Betinho, a Ação da Cidadania transformou-se numa referência no combate à fome no Brasil, com mais de três mil voluntários que atuam em todas as capitais dos estados do país.

Com sede nesta localidade desde 2020, a Ação da Cidadania distribui pela população ao entorno 1.000 refeições, com fruta, água e talheres biodegradáveis, por dia, a mesma alimentação que está a ser dada aos jornalistas e funcionários afetos às reuniões do G20 e confecionada na cozinha solidária, explicou à Lusa o presidente do Conselho da Ação da Cidadania Daniel Souza, filho de Betinho.

“Imprensa e ‘staff’ estão a comer exatamente a mesma comida que a gente distribui”, disse, explicando que a cozinha solidária foi criada em 2020 “por conta da extrema pobreza”, porque “não adianta você chegar a uma pessoa em situação de rua e dar um quilo de feijão cru, porque ele não tem como cozinhar”.

Durante a intensa semana de reuniões, onde se discute o combate às desigualdades, à fome no mundo e um imposto sobre os super-ricos, membros das delegações do G20 terão a oportunidade de conhecer a estrutura física e logística da organização, que conta com uma área de Agroecologia, com duas hortas urbana, com formação e capacitação na área da cultura para 220 jovens que estudam “durante o ano inteiro circo, dança, teatro, canto, interpretação, nos vários espaços aqui”, detalhou Daniel Souza.

A ideia é “levar o Presidente Lula para conhecer a cozinha solidária” na quarta-feira, contou, dia em que o chefe de Estado brasileiro espera recolher o máximo de apoio possível e lançar a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza num evento que contará com a presença de vários ministros internacionais, entre os quais o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel.

As expectativa de Daniel Souza sobre uma grande adesão dos países estão elevadas: “sendo aqui, com o Lula, que é um Presidente conhecido internacionalmente por ter uma preocupação com a fome, convocando para um problema que não é só brasileiro, que está piorando, sendo por conta das guerras, dos êxodos”, disse.

“Se a gente aqui com o que foi feito não conseguir sensibilizar, eu não sei o que sensibiliza”, frisou, acrescentando estar orgulhoso de receber o evento.

Há a possibilidade de Daniel Souza intervir na sessão de abertura de quarta-feira no G20 e, se tal acontecer, garante que vai pedir aos tradutores que traduzam a frase mantra da organização: “quem tem fome tem pressa”.

Em 2022, de acordo com as Nações Unidas, cerca de 750 milhões de pessoas no mundo passavam fome.

“Qualquer que seja a discussão, qualquer que seja a decisão, ela tem que gerar factos e ações imediatamente”, sublinhou, afirmando que “os desafios não são impossíveis”.

“Uma coisa é aquela loucura que está acontecendo na guerra da Ucrânia. Aquilo ali é muito difícil de você resolver. Agora, a fome?”, questionou, acrescentando que “o que esses líderes precisam fazer aqui é uma ação de cidadania para acabar com a fome”.

Daniel Souza lembrou que o Brasil mostrou que através de políticas públicas conseguiu sair do mapa da fome”, em 2014, muito por conta dos dois primeiro mandatos de Lula da Silva e da então Presidente, Dilma Rousseff.

“Sair do mapa da fome não é nem mágica nem milagre, é simplesmente trabalho e vontade política”, garantiu, recordando contudo, que o país voltou em 2022 ao Mapa da Fome, segundo a ONU. Os responsáveis, disse o ativista, foram os ex-Presidentes Michel Temer e Jair Bolsonaro, que desmantelaram políticas públicas e programas de apoio.

Em 2022, segundo a ONU, cerca de 33 milhões de brasileiros passam fome todo dia, um número maior do que os 31 milhões em 1993, quando foi criada a Ação da Cidadania.

Com o regresso das políticas públicas implementadas por Lula da Silva há uma esperança: “Em breve vamos sair do mapa da fome de novo, talvez daqui a um, máximo dois anos”, apostou.