Alimentação Tradicional e Saúde 1257

A humanidade poderá ter sacrificado a sua saúde ao desvincular crescentemente os produtos alimentares da cultura culinária tradicional. A verdade é que a nossa saúde não é independente da saúde do sistema alimentar onde estamos inseridos.

Sabemos que a agricultura moderna enfraqueceu a ligação com os solos, os alimentos e as culturas locais, privilegiando a quantidade e a simplificação dos sistemas de produção orientados para a obtenção de alimentos refinados e processados.

Estamos a produzir mais calorias por hectare mas talvez menos nutrientes adequados. E estes últimos fazem-nos muita falta. Mais do que imaginamos. Poderíamos então pensar que comendo alimentos designados como saudáveis e fazendo exercício físico resolvemos o problema. Em parte sim. Mas não totalmente. Se uma dieta mais rica em hortofrutícolas frescos pode reduzir a deficiência em micronutrientes, parece que atualmente teríamos necessidade de comer um volume muito maior desses produtos, para se obterem os micronutrientes que anteriormente obtínhamos em produtos oriundos de modelos produtivos mais tradicionais. E isto porque, como dizíamos no início deste artigo, a agricultura moderna foi rompendo o ciclo natural dos nutrientes. Para o recuperarmos temos que repensar o modelo técnico global da agricultura moderna. Felizmente já o estamos a fazer. Ao mesmo tempo, a tendência para a simplificação dos sistemas agrários levou a uma simplificação das dietas globais que hoje se concentram em quatro produtos: milho, soja, arroz e trigo, por oposição às perto de oitenta mil espécies historicamente utilizadas na alimentação pela humanidade.

O mercado de suplementos alimentares cresce. Cada vez são mais recomendados e utilizados.

Mas é preciso ter atenção que estes não têm o mesmo efeito que o alimento completo de onde foram retirados. Sabemos, por exemplo, que tomando em doses adequadas todos os componentes bons dos cereais integrais (nomeadamente, fibra, vitamina E, ácido fólico, acido fítico, magnésio, manganês, ferro e zinco) o efeito obtido na saúde será muito inferior ao consumo desses mesmos cereais.

Esse é um dos papéis da alimentação tradicional. A de repositório de uma longa experiência e de uma lógica nutricional nada menosprezável. Comendo o que a nossa avó nos recomenda e com prazer também protegemos a saúde.

Francisco Sarmento,
Chefe do Escritório de Informação da FAO em Portugal e junto da CPLP