Microbiota do Solo ao Prato: o projeto WHEATBIOME na inovação para uma Alimentação Sustentável 837

Por Ana Faria, Professora Associada com Agregação da Nova Medical School (NMS), Investigadora CHRC e Coordenadora da participação da NMS no Projeto WHEATBIOME (101084344). 

 

A capacidade de aumentar o rendimento das plantas é tão importante quanto a melhoria da sua qualidade (perfil nutricional e segurança alimentar). A composição química das plantas depende da variedade genética, mas também de fatores bióticos e abióticos (por exemplo, localização, uso de fertilizantes, condições de humidade, tipo de solo e outros fatores agronómicos). No entanto, um elemento ainda desconhecido para compreender totalmente estas dinâmicas biológicas reside nas comunidades microbianas associadas às plantas. As plantas são um holobionte: um macro-organismo que só pode ser completamente compreendido ao incorporar a sua microbiota associada. De facto, as interações entre plantas e microrganismos são consideradas um componente-chave da evolução, adaptação e ecologia das plantas, tendo sido demonstrado que o microbiota ajuda as plantas a tolerar o stress biótico e abiótico.

Para além do seu papel do microbiota dos solos e das plantas no desenvolvimento e funcionamento do sistema imunitário humano, os microrganismos do solo têm efeitos diretos e indiretos na sustentabilidade, qualidade e segurança dos sistemas alimentares, influenciando assim a saúde e a nutrição humanas. Garantir um fornecimento de alimentos sustentável, nutritivo e estável para uma população mundial em crescimento depende da interação entre múltiplos componentes do sistema alimentar, desde a produção e distribuição de produtos alimentares até às práticas do consumidor e pós-consumo.

O WHEATBIOME é um projeto financiado pela Comissão Europeia que visa contribuir significativamente para uma melhor compreensão da biodiversidade do microbiota, desde o solo até ao prato, incluindo patogénios e microrganismos benéficos, bem como as suas interações nos níveis das plantas, animais, humanos e alimentos, no contexto One Health (uma só saúde). Com o reconhecimento do microbiota como um fator determinante na saúde humana, o papel do microbiota de outros ambientes, até aqui não tão investigados ou reconhecidos, ganha uma importância maior.

Focado no trigo, este projeto irá proporcionar conhecimento na investigação sobre a interação e função do microbiota, promovendo sistemas agrícolas e alimentares mais sustentáveis (circulares, ambientalmente responsáveis, biodiversos e economicamente equilibrados), influenciando positivamente a transição para produtos alimentares e rações mais nutricionalmente mais adequados, seguros e sustentáveis.

As intervenções naturais ou humanas podem causar um desequilíbrio nestas comunidades microbianas, resultando em efeitos prejudiciais para a planta e para o ambiente. O genótipo do trigo desempenha um papel fundamental na microbiota, e as práticas agrícolas podem afetar a microbiota associada ao trigo (por exemplo, os fertilizantes estimulam a libertação microbiana de 4 a 6 toneladas de óxido nitroso por ano). As propriedades químicas do solo parecem não afetar diretamente a qualidade dos grãos (por exemplo, o teor de proteína), mas sabe-se que as propriedades físicas e químicas do solo influenciam a estrutura da comunidade microbiana do trigo e parecem também ser um fator essencial no controlo dos níveis de proteínas imunogénicas (por exemplo, o stress hídrico durante as fases finais do desenvolvimento da planta aumenta significativamente os níveis de proteínas imunogénicas nas culturas de trigo).

É essencial alargar o conhecimento sobre o microbiota para além do microbiota humano, reconhecendo o seu impacto direto na produção e qualidade dos alimentos que consumimos. Ao aprofundarmos a investigação sobre o microbiota em todas as suas dimensões, o projeto WHEATBIOME estará a abrir caminho para uma alimentação mais saudável, sustentável e adaptada aos desafios globais do futuro.