Médico: «Estamos muito desprevenidos ao nível terapêutico» em relação à anorexia 675

08 de Junho de 2016

«Estamos muito desprevenidos ao nível terapêutico, e nenhum país tem um medicamento com autorização de venda ao público para a anorexia», observou Philip Gorwood, chefe de serviço do hospital de Saint-Anne, em Paris, referindo que só há «verdadeiras remissões num terço dos casos».

A anorexia nervosa, que afeta sobretudo as adolescentes, não se explica pelo medo de engordar, mas antes pelo prazer de emagrecer, pertencendo assim ao domínio das dependências, sugere um estudo publicado ontem, noticiou a “Lusa”.
 
Esta patologia rara, de componente genética, predomina nas raparigas – a proporção é de nove raparigas para um rapaz – e atinge entre 0,2% e 0,5% da população, com um pico dos 13 aos 25 anos, segundo Philip Gorwood.

Muito menos frequente que a bulimia (há cinco bulímicos por cada anoréxico), a anorexia tem a mais elevada taxa de mortalidade por suicídio de todas as patologias mentais (como a bipolaridade ou a esquizofrenia), segundo o especialista que dirigiu o estudo publicado na revista especializada Translational Psychiatry.

A anorexia tem uma forte componente hereditária (70%), segundo estudos anteriores, nomeadamente nos graus de parentesco diretos e nos gémeos.

Contudo, «não existe um gene da anorexia, mas genes de vulnerabilidade» em relação a este distúrbio, sublinha Gorwood.

O diagnóstico deste distúrbio do comportamento alimentar assenta habitualmente em três critérios internacionais: a presença de uma restrição alimentar que conduz à perda de peso, uma perceção distorcida do peso e do corpo e um medo intenso de engordar, de acordo com o manual da Associação Americana de Psiquiatria (DSM-5).

Todavia, os investigadores que defendem que o distúrbio é mais uma dependência que uma fobia, quiseram aprofundar essa pista aberta através de trabalhos recentes que apontam um desregulamento do «circuito da recompensa» observado nas dependências.

Os investigadores analisaram, então, as reações espontâneas de 70 mulheres doentes e de 20 saudáveis ao apresentarem-lhes imagens de pessoas com diferentes pesos, utilizando um teste que mede o nível de sudação da pele.

A emoção provocada por algumas imagens desencadeia, de facto, um aumento rápido e automático da transpiração.

Nestas doentes, de pesos variados e apresentando diversos níveis de gravidade da doença, a visão das imagens de mulheres de peso normal ou excesso de peso provocou uma reação comparável à dos sujeitos sãos.

Em contrapartida, perante imagens de magreza, as doentes tiveram reações emocionais positivas, ao passo que as mulheres saudáveis não tiveram uma reação particular.

Nas doentes com anorexia nervosa, o aumento de transpiração perante as imagens de magreza corporal poderá explicar-se com a presença de uma forma específica (chamada “alelo Met”) do gene, segundo a análise dos investigadores.

Esta «fortíssima probabilidade» de a anorexia ser «do domínio das dependências» deverá melhorar a adoção de algumas abordagens terapêuticas como, por exemplo, «a terapia com plena consciência», defendeu Philip Gorwood.