Investigadores do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto integram um projeto europeu que pretende encontrar uma solução baseada na neuromodulação para reduzir a dor crónica do doente oncológico e melhorar a qualidade de vida, já que se estima que 59% dos pacientes em tratamento oncológico, 64% dos pacientes com doença oncológica avançada e 33% dos doentes curados sofram de dor crónica.
Intitulado de PAINLESS, o projeto visa implementar uma intervenção domiciliária baseada na neuromodulação para reduzir a dor e melhorar a qualidade de vida destes doentes. Assim sendo, divide-se em três vertentes, sendo que a primeira é liderada pelo IPO do Porto e consiste em perceber os mecanismos com os quais o cérebro processa a dor.
Até março de 2025, está prevista a avaliação e monitorização de 450 doentes, sendo que 140 doentes pertencem ao IPO do Porto.
Em declarações à Lusa, o investigador e professor Rui Medeiros salientou que “cada doente tem diferentes sensibilidades à dor”, pelo que o projeto permitirá uma “avaliação personalizada” desta condição.
“A dor é uma área onde não tem havido investigação muito avançada nos doentes oncológicos”, observou, indicando que o objetivo é mudar esse paradigma.
A oncologista Cláudia Vieira, ainda segundo a agência Lusa, destacou a forma como a dor crónica condiciona o dia a dia dos doentes oncológicos, repercutindo-se na perda de sensibilidade das mãos e pés, e em perturbações de sono.
“Queremos sensibilizar o doente, mas também a sua família. É uma fase emotiva para o doente e isto pode ser considerado mais uma sobrecarga, mas é muito importante”, observou, esclarecendo que a primeira avaliação tem de ser anterior ao primeiro tratamento oncológico.
No IPO do Porto foi montada uma “sala especializada” para a avaliação dos doentes, que são expostos a estímulos térmicos (calor e frio) e táteis (sensibilidade), que permitem, posteriormente, avaliar a resposta do sistema nervoso central e periférico de cada doente.
“São medidos determinados biomarcadores relacionados com essa resposta e através de Inteligência Artificial é desenvolvido um modelo de sensibilidade à dor. Cada doente terá o seu perfil, o que ajudará a uma intervenção mais adequada”, esclareceu Rui Medeiros.
Os doentes são expostos três vezes a avaliação, antes e após os tratamentos de quimioterapia, para também se compreender como é que a terapêutica “influencia a sensibilidade”.
“Queremos encontrar formas de tratamento mais eficazes”, esclareceu Cláudia Vieira, notando que esta condição é atualmente tratada com fármacos, a maioria dos quais autorizados para doenças como a depressão e epilepsia.
“A dor oncológica existe e tem particularidades especiais. A nossa tentativa é ter uma intervenção personalizada, adequando a cada doente o melhor que podemos oferecer”, acrescentou Rui Medeiros.
Depois de consolidados os dados da avaliação e monitorização dos doentes, os investigadores vão explorar se esses mecanismos com os quais o cérebro processa a dor são comuns em indivíduos saudáveis e doentes com cancro.
Posteriormente, vão avaliar a viabilidade e eficácia da entrega domiciliária de estimulação elétrica transcraniana de baixa intensidade para cuidados paliativos de pacientes com cancro que sofrem de dor.
Financiado em cerca de 2,5 milhões de euros pela Comissão Europeia, o projeto envolve 17 parceiros de dez países (Portugal, Espanha, Alemanha, Dinamarca, Roménia, Israel, Suíça, Bélgica, França e Chéquia) e decorre até 2027.