O microbiota intestinal, isto é, o conjunto de microrganismo que coloniza o nosso intestino, é um importante fator para o desenvolvimento do sistema imunitário do hospedeiro.
A “educação” do sistema imunitário tem início ainda durante a gestação, através de “sinais” do microbiota da mãe que atravessam a placenta. Estas moléculas com origem microbiana estão também presentes no leite materno e são responsáveis por preparar a imunidade inata do recém-nascido para a colonização do intestino. Ou seja, esta exposição a compostos de origem microbiana in utero treina o sistema imunitário do recém-nascido e evita que o mesmo reaja de forma exacerbada quando é exposto à “onda” de microrganismos que existem no meio ambiente.
Durante o período neonatal (primeiras semanas de vida do bebé), os microrganismos que colonizam o intestino induzem o desenvolvimento do tecido linfóide intestinal e a maturação das células linfoides e mielóides. Não obstante, há ainda outra janela temporal durante a qual a exposição a microrganismos se afirma crítica para o desenvolvimento do sistema imunitário. Esta janela temporal corresponde ao período no qual se inicia a diversificação alimentar (4-6 meses de idade). A introdução de alimentos sólidos, neste período, permite o crescimento e a expansão de microrganismos no intestino e é acompanhada por uma forte resposta do sistema imunitário (aumento dos níveis de mediadores inflamatórios no intestino). Este aumento fisiológico da reatividade do sistema imunitário ocorre em resposta à expansão de microrganismos.
No entanto, quando esta resposta é perturbada, quer pela toma de antibióticos quer pela exposição a um microbiota em desequilíbrio (disbiose), perde-se a oportunidade para o “imprinting” (memória) do sistema imunitário e, aparentemente, esta resposta não pode ser compensada mais tarde. Assim, um “imprinting” patológico neste período traduz-se numa maior suscetibilidade às doenças inflamatórias na idade adulta assim como numa maior reatividade à imunoterapia e à vacinação.
O microbiota está, portanto, no centro da resposta do sistema imunitário e é um importante fator a ter em conta no desenvolvimento de doenças inflamatórias. Atualmente, há vários estudos dedicados a explorar a natureza do “imprinting” do sistema imunitário induzido pela microbiota no início da vida. Espera-se que a melhor compreensão deste fenómeno traga, no futuro, novas oportunidades terapêuticas e preventivas contra estas doenças inflamatórias.
Cláudia Marques
Nutricionista (0268N)
Professora Auxiliar Convidada, NOVA Medical School|Faculdade de Ciências Médicas, Universidade NOVA de Lisboa
Investigadora do grupo ProNutri, CINTESIS
Co-founder of YourBiome Therapeutics