Imposto sobre o Valor Acrescentado 1661

O Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) é um imposto aplicado às vendas de produtos e serviços, pago por quem adquire esse produto ou serviço. Existem 3 taxas de IVA (em Portugal continental, 6%, 13% e 23%), além dos produtos ou serviços que estão isentos (como é o caso dos serviços de saúde). Assim, num cabaz de compras normal, podemos encontrar alimentos com taxa de IVA reduzida (pão, arroz, frutas e hortaliças frescas), intermédia (café ou compostas) ou normal (águas gaseificadas ou chocolates). É também interessante notar que um mesmo produto, vendido num supermercado ou num restaurante, pode ser taxado de forma diferente – por exemplo, uma garrafa de vinho no supermercado paga 13% de IVA, mas se for servida num restaurante está sujeita à taxa de 23%. Vem isto a propósito da recente publicação da lista de bens alimentares que serão isentos de IVA, uma medida do Governo que visa mitigar os efeitos da inflação e do aumento do custo dos alimentos. Esta isenção do IVA em alimentos essenciais foi defendida pelos nutricionistas e, além do envolvimento dos setores da Produção e Distribuição, contou também com um parecer do Ministério da Saúde, na definição dos alimentos que deveriam ser abrangidos por esta medida. Mas será a redução do IVA suficiente para as famílias (sobretudo as mais carenciadas) manterem o acesso a uma alimentação adequada? E que impacto poderá ter a redução de preços na promoção de uma alimentação mais saudável?

Em primeiro lugar, é importante notar que medidas fiscais não são necessariamente medidas de saúde. A operacionalização de decisões sobre impostos tem fortes implicações no sistema tributário, que vão desde alteração de softwares de faturação, aos ajustes no cálculo dos valores a cobrar. Isto significa que os requisitos necessários ao desenho dos impostos nem sempre são conciliáveis com os parâmetros de “saúde” desejados pelos nutricionistas (e não só!). Por isso mesmo, após a publicação da lista de 44 produtos abrangidos pela isenção de IVA, houve queixas relativas à exclusão de alimentos como a carne de coelho, certos tipos de peixe ou de alimentos para regimes alimentares vegetarianos.

Relativamente ao impacto desta redução do IVA na promoção da alimentação saudável, há alguns aspetos que merecem reflexão por parte dos nutricionistas. É um princípio básico das políticas de promoção de saúde que as escolhas mais saudáveis devem ser as mais fáceis (o que inclui serem também as mais baratas). No entanto, no cenário atual de inflação ainda não controlada, é importante ter presente que, não só os preços não voltarão aos valores do início do ano passado (para tal, seria necessário um cenário de deflação ou grande redução dos custos de produção/distribuição), como continuarão a aumentar. Tendo em conta que esta redução do IVA é temporária (vigorará durante 6 meses), é possível que no fim do ano, estes alimentos voltem a ter um aumento significativo do preço, dado que ao fim da isenção do IVA se juntará o valor da inflação entretanto decorrida. Por isso mesmo, todo o sistema de produção e distribuição dos alimentos tem de ser questionado e otimizado, de forma a garantir que alimentos saudáveis e essenciais se mantêm ao alcance de todos os segmentos da população. É uma tarefa muito complexa e demorada!

Outro aspeto importante, mas a curto prazo, passa por garantir que a redução do IVA se traduz numa efetiva redução dos preços ao consumidor. No passado, assistimos a medidas similares que não resultaram em benefícios imediatos ou óbvios para os consumidores – por exemplo, quando baixou o IVA da restauração (uma medida desenhada para aumentar o emprego no setor), da inscrição nos ginásios (que já sofreu aumentos e reduções da taxa de IVA) ou, mais recentemente, das bicicletas (por razões diversas, os preços não baixaram em todas as bicicletas). Para isso, é necessário conhecer os fatores que influenciam o preço de alimentos “saudáveis” e monitorizar a sua evolução ao longo do tempo. Isto é importante não apenas para perceber o real impacto desta medida, mas também para o desenho de políticas de saúde pública (e não apenas de medidas fiscais). Da mesma forma que os serviços de saúde estão isentos de IVA, também os alimentos que mais contribuem para a manutenção de um bom estado de saúde e para a prevenção de doenças, poderiam estar isentos – fruta e hortícolas frescos ou leguminosas são exemplos de alimentos cujo consumo pode ser estimulado através de um preço mais baixo. A criação de um observatório que inclua nutricionistas e monitorize os preços e vendas de alimentos “saudáveis” seria uma medida útil para aproveitar esta redução do IVA. Além disso, este observatório poderia também monitorizar o impacto de campanhas de promoção de alimentação saudável, como a que está atualmente em vigor! É na concertação de todas estas ações que se conseguem mudanças a médio-longo prazo, em vez de anúncios pontuais.

O IVA é algo que todos pagamos, todos os dias, e por isso o seu peso na nossa carteira acaba por passar tantas vezes despercebido. Mas não deixa de ser interessante notar que, em 2023 e com tudo o que já sabemos sobre o impacto da nutrição na saúde das populações, alimentos com valor acrescentado para a saúde, continuem a pagar um imposto sobre valor acrescentado.

Por Rodrigo Abreu
Nutricionista – Managing Partner na Rodrigo Abreu & Associados
Fundador do Atelier de Nutrição