Os graves níveis de fome atuais são a “ponta do iceberg” e a insegurança alimentar deverá atingir pessoas que não corriam esse risco, afirma Monika Tothova, economista da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO).
Em entrevista à Lusa, a especialista em políticas agrícolas e alimentares explicou que, caso a atual crise alimentar global se arraste, muitas famílias perderão poder de compra e precisarão de fazer refeições menos nutritivas ou até reduzir o número de refeições diárias.
“Os níveis de fome e os níveis de emergência são a ponta do iceberg, sendo provável uma deterioração significativa”, afirmou Tothova. “Mesmo as pessoas que ainda não estão em níveis de insegurança alimentar de emergência provavelmente serão afetadas, pois o seu poder de compra diminuirá”, entre outras consequências.
Estas possibilidades terão impacto na saúde e bem-estar dessas famílias, incluindo no aumento da prevalência de desnutrição, assim como a perda e o atraso no crescimento das crianças, destacou Monika Tothova.
A guerra da Rússia na Ucrânia perturbou o equilíbrio alimentar global e está a levantar temores de uma crise que já está a afetar, em particular, os países mais pobres. Juntas, a Ucrânia e a Rússia produzem quase um terço do trigo e da cevada do mundo e metade do óleo de girassol, enquanto a Rússia e a sua aliada Bielorrússia são dos maiores produtores mundiais de potássio, um ingrediente-chave de fertilizantes.
Nesse sentido, a guerra levou a um aumento nos preços mundiais de cereais e óleos, cujos valores superaram os alcançados durante as Primaveras Árabes de 2011 e os “motins da fome” de 2008. “A guerra na Ucrânia ocorreu no momento em que o mundo recuperava da pandemia de Covid-19. Ao mesmo tempo, a insegurança alimentar estava a aumentar em todo o mundo, porque muitas pessoas perderam os meios de subsistência”, garante.
A especialista da FAO destacou ainda que para se conseguir manter o financiamento humanitário para assistência vital, incluindo assistência alimentar, seriam necessários mais de 70 milhões de dólares (65,2 milhões de euros) por mês, citando dados do Programa Alimentar Mundial.