Já foi há 35 anos (1988) que a Assembleia Geral das Nações Unidas e a OMS instituíram o dia 1 de dezembro como Dia Mundial de Luta contra a SIDA. Tinham então decorrido cerca de sete anos desde os instantes em que foram descritos os primeiros casos daquela estranha pneumonia, acompanhada de uma marcada supressão imunológica, que parecia atingir sobretudo a comunidade homossexual nos Estados Unidos.
Destes tempos até aos nossos dias, poder-se-á afirmar que quase tudo mudou?
Efetivamente, os avanços científicos na área foram gigantescos e rápidos, considerando tratar-se de uma patologia identificada há pouco mais de 40 anos. O conhecimento do seu agente, epidemiologia, fisiopatologia e consequente terapêutica, levou a progressos extraordinários na abordagem dos doentes, estando hoje distantes os tempos em que se falava de uma sentença de morte. Estamos hoje perante uma doença crónica, com supressão virológica e reconstituição imunitária como objectivos facilmente alcançáveis na maioria dos casos, com terapêuticas cómodas e bem toleradas.
Realmente, podemos afirmar com segurança que as mudanças foram gigantescas.
Faz assim sentido continuar a assinalar este dia mundial e a chamar a atenção para a Doença VIH?
Desde já podemos afirmar que a resposta é um enorme SIM, por vários motivos:
Os avanços terapêuticos e de manejo da doença não foram acompanhados socialmente. Mantém-se a discriminação e o estigma a que estes doentes estão sujeitos. Tal deve-se aos eternos preconceitos, o não aceitar do “outro” e a uma continuada ignorância e desinformação em relação às formas de transmissão da doença. Esta situação é particularmente chocante entre estudantes universitários, autoridades de segurança e até em profissionais de saúde.
Existe informação relativamente recente que deve ser difundida à população, tal como a possibilidade de profilaxia pré-exposição, o mais próximo que temos de uma vacina; o conceito de “carga viral indetetável = vírus intransmissível” acentua a necessidade de diagnóstico e tratamento de todos os casos, podendo o seu conhecimento levar a uma redução do estigma.
A menor visibilidade da Doença VIH nos media tem-se traduzido num aumento do número de novos casos nalguns grupos populacionais, nomeadamente homens que têm sexo com homens em idades muito jovens e também transmissão heterossexual em faixas etárias acima dos 50 anos.
Tem aumentado o número de diagnósticos em fases avançadas da doença, durante internamentos hospitalares, já com grave depressão imunitária e com doenças oportunistas. A falta de sensibilização da população e de profissionais de saúde conduz a um rastreio insuficiente e a dramáticos diagnósticos tardios. É necessário testar mais e tratar mais.
Não sendo hoje a doença VIH a tal “sentença de morte” de há 30 anos, ela continua a ser uma doença crónica, com necessidade de medicação permanente e vigilância atenta de comorbilidades e eventos adversos.
Vamos assim assinalar este Dia Mundial de luta contra a SIDA em 2023 de uma forma descomplexada, comemorativa, e com o máximo de informação a todos.
Fausto Roxo – Coordenador do Núcleo de Estudos da Doença VIH da SPMI