Investigadores da Fundação Champalimaud descobriram um novo mecanismo orquestrado entre o sistema digestivo e o cérebro que faz com que se procure determinados alimentos,o que pode ajudar a perceber alguns distúrbios relacionados com alimentação.
Este estudo é da responsabilidade do investigador Albino Oliveira-Maia, diretor da Unidade de Neuropsiquiatria do Centro Champalimaud, e foi publicado na revista científica Neuron.
Esta investigação pretende dar resposta sobre a ligação entre os sistemas digestivo e nervoso e como é que isto pode influenciar o comportamento e, neste caso, as escolhas alimentares.
Para Albino Oliveira-Maia “a boca é o primeiro local de controlo – onde é feita a decisão sobre se a comida deve, ou não, ser ingerida”. “Uma vez dentro do organismo, a comida é divida em nutrientes e começa a pós-ingestão”, explica o investigador.
“É aqui que o sistema digestivo “prova” a comida e conversa com o cérebro sobre a sua escolha de refeição”, esclareu.
Segundo o investigador, os processos pós-ingestão podem ser divididos em dois: o primeiro lida com o presente, avaliando quão nutritivo é o alimento e a quantidade que deve ser consumida, e o segundo é um processo de aprendizagem que determina como, no futuro, o organismo deve reagir a esse alimento.
“A avaliação que um organismo faz acerca do valor nutricional de um alimento e que leva um indivíduo a desenvolver uma preferência por esse alimento é um exemplo dessa ‘aprendizagem pós-ingestão’”, explica a Fundação Champalimaud, em comunicado.
No sentido de descobrirem o que leva humanos e animais a procurarem ativamente determinados alimentos, fizeram uma pequena experiência, em que os animais pressionavam alavancas para receber a comida por uma injeção diretamente no estômago. Daqui concluíram que mesmo sem provar a comida, os ratinhos tinham uma clara preferência para a alavanca previamente associada à administração do alimento de alto valor calórico.
Depois tentaram perceber como é que as informações sobre o valor nutricional chegam ao cérebro, analisando o nervo vago, que “estabelece ligações bidirecionais entre o cérebro e vários órgãos internos”. Os investigadores perceberam, através da ligação hepática (ao fígado) do nervo vago que era por aí que se transmitiam os sinais pós-ingestivos ao cérebro durante o processo de aprendizagem.
A seguir foi a vez de perceber para onde, no cérebro, estavam a ser enviados os sinais pós ingestão, tendo descoberto que os neurónios da dopamina estavam envolvidos nesse novo processo de aprendizagem.
Por fim testaram, e comprovaram, que os neurónios são influenciados pelo ramo hepático do nervo vago. “Este estudo mostrou que esses neurónios também são ativados quando o alimento chega ao estômago e ao intestino”.
“Em conjunto, os resultados do estudo revelam um novo processo de aprendizagem – orquestrado entre o sistema digestivo e o cérebro – que faz com os animais procurem determinado tipo de alimentos sem nunca terem sentido o seu sabor, o que comprova a influência de processos subconscientes no controlo do comportamento alimentar”, refere a nota da Fundação Champalimaud.
Oliveira-Maia considera que, embora possa não ter aplicações clínicas imediatas, este trabalho poderá ser relevante para a compreensão e tratamento de distúrbios relacionados com a alimentação, como a obesidade.
“Ainda é muito cedo para saber onde este estudo nos levará. Contudo, foi a relação entre alterações de recetores de dopamina e obesidade que inspiraram o desenvolvimento deste trabalho”, conclui o investigador.