A população de Portugal tem uma prevalência de défice de vitamina D superior à média europeia, e mesmo à dos países do sul da Europa, devido a algumas alterações genéticas. Os investigadores defendem que esta é uma questão evolutiva e da nossa história, muito influenciada pelos povos de África.
Durante a pandemia, investigadores do estudo VITACOV acrescentaram o fator genético à sua análise. A investigação envolveu equipas do Centro Cardiovascular da Universidade de Lisboa, (sob a coordenação de Fausto Pinto), Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa (coordenação de Conceição Calhau), Faculdade de Medicina do Porto (coordenador: João Tiago Guimarães), a HeartGenetics — Genetics and Biotechnology SA (coordenação de Ana Teresa Freitas) e plataforma BioData.pt (Ana Portugal Melo).
Logo em fevereiro de 2020, quando a pandemia atingiu a Europa, nomeadamente Itália e Espanha, “começamos a ter números muito elevados e assustadores. Percebemos que não tardaria a chegar muito a Portugal”, revela Conceição Calhau. Em março, “já se sabia que os hipertensos, diabéticos e obesos, quando infetados, apresentavam risco de quadros mais severos. Todas estas condições estavam muito associadas à deficiência de vitamina D”.
O estudo VITACOV, que avaliou os níveis de vitamina D em 517 doentes admitidos com o diagnóstico de Covid-19 nos Hospitais de Santa Maria em Lisboa e do São João no Porto, mostrou que, de facto, as pessoas com níveis muito baixos de vitamina D apresentavam uma resposta demasiado agressiva à Covid-19, que conduzia a formas mais graves da doença.
Estes dados eram consistentes com outros estudos realizados em países do Sul da Europa. Mas o VITACOV foi mais longe: os investigadores concluíram que a população de Portugal tem uma prevalência superior à média europeia, e mesmo à dos países do sul da Europa, devido a algumas alterações genéticas que levam a uma predisposição para o défice de vitamina D.
Conceição Calhau refere que a explicação está na “característica genética de uma enzima, que ‘rapta’ o precursor da vitamina D — disponível na pele para ser ativado pela radiação ultravioleta e originar vitamina D — para uma via paralela, que é a síntese de colesterol”.
A especialista considera que em Portugal ainda há muito preconceito relativamente à suplementação de vitamina D e que a questão da Covid-19 acabou por voltar a levantar a questão. “Em qualquer situação, seja de prevenção ou de intervenção, o mais sensato e a melhor atitude clínica, é não suplementar ‘às cegas’, mas individualizar, identificar os níveis, determinar o alvo e suplementar até a pessoa atingir a dose alvo”.
Obviamente que “a vitamina D não é a panaceia ou a cura para todos os males”. Mas “é importante perceber que devemos corrigir a deficiência de vitamina D e, dentro dos cut off que estão perfeitamente identificados para as doenças respiratórias, musculoesqueléticas ou para a doença autoimune, conseguir que o paciente atinja níveis adequados no sangue”.
“Herança do passado predispõe para défice na população” é um dos artigos especiais da última edição da revista VIVER SAUDÁVEL, afeta aos meses de novembro e dezembro, já disponível. Conheça as características genéticas portuguesas associadas a África na rua revista profissional.