27 de julho de 2018 Investigadores do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S) descobriram o gene responsável pelo processo infecioso da listeriose, uma infeção de origem alimentar que «mais mortes causa atualmente na Europa». Com sintomas semelhantes aos de uma gripe, esta infeção, cujo tratamento é realizado com antibióticos e pode demorar vários meses, «embora desconhecida para a maioria, tem uma taxa de mortalidade muito grande, de cerca de 20%», disse à agência “Lusa” o investigador do i3S Didier Cabanes, coordenador do estudo. De acordo com o instituto de investigação, as bactérias patogénicas dependem de um conjunto de genes que determinam o seu grau de patogenicidade, ou seja, a sua capacidade para infetar com sucesso o hospedeiro. Esses genes estão relacionados com funções cruciais, como a capacidade de invasão, de aproveitamento nutricional ou de enganarem o sistema imunológico do hospedeiro. Quando «estão num ambiente onde não necessitem desses mecanismos de infeção», os mesmos mantêm-se inativos, porém, ao entrarem num novo ambiente, como o organismo humano, «ativam um conjunto de cadeias regulatórias a nível genético para rapidamente responderem às novas condições», informou o i3S. Neste estudo, que deu origem a um artigo publicado na revista académica Nucleic Acids Research, a equipa descobriu que é o gene denominado MouR que determina a patogenicidade da bactéria Listeria monocytogenes, responsável por causar a listeriose. Este gene é responsável por «uma adaptação radical da bactéria» ao organismo que, além de desencadear um conjunto de mecanismos que lhes permite enganar o sistema imunológico e estimular a capacidade proliferativa da bactéria, tem a capacidade de formar biofilmes no trato intestinal humano. O investigador explicou que quando uma bactéria entra em contacto com a parede intestinal do hospedeiro, a mesma adere à parede, constituindo aí uma comunidade de bactérias, que desempenham diferentes papéis. Algumas dessas bactérias ficam na superfície, «de forma a proteger as que estão dentro da parede contra o mecanismo de defesa que normalmente existe no intestino, o que designamos por biofilme», esclareceu. Assim, apesar de muito comum no ambiente, quando em contacto com o organismo humano, a bactéria adapta-se e transforma-se «num patogénico letal, pronto para vencer as condições hostis do trato digestivo e invadir o nosso organismo, ultrapassando as nossas defesas e barreiras», acrescentou. Segundo o i3S, alimentos manipulados inapropriadamente ou frigoríficos pouco cuidados, são «a fonte perfeita para a contaminação», correndo maior risco as pessoas imunodeprimidas, os idosos, e, sobretudo, as grávidas. «Quando uma grávida come algo contaminado pela bactéria, esta vai diretamente para a placenta, onde origina uma infeção, que, muitas vezes, pode levar ao aborto», referiu o coordenador. Devido a isso, continuou, as grávidas devem ter em atenção os cuidados com a alimentação, evitando produtos confecionados há muito tempo ou que não tenham sido devidamente limpos antes do consumo. Em Portugal, o último surto de listeriose declarado foi em 2011, associado ao consumo de um queijo específico, que causou infeções graves em 30 pessoas, 11 das quais não sobreviveram. Recentemente, o maior surto reportado ocorreu na África do Sul, originando mil casos detetados e 200 mortes registadas, indicou ainda o i3S. «Há muito que a equipa tenta descobrir como é que a Listeria adquire esta patogenicidade e, neste trabalho, não só descrevemos o elemento regulador do processo como o caracterizámos estruturalmente, abrindo portas ao desenho de novas abordagens terapêuticas» e à «compreensão de outras infecções», disse ainda o investigador. |