Crónica Nutricional para Hipertensos 822

As doenças cardiovasculares continuam a ser uma importante ameaça à população do século XXI. O facto de se ter comprovado cientificamente que a sua prevenção é conseguida de forma muito eficaz através de uma dieta e estilo de vida saudáveis leva a que estas medidas devam ser divulgadas mundialmente, sendo uma prioridade em termos de saúde pública.

O estudo Predimed, com posteriores análises publicadas nos últimos 3 anos em revistas médicas de alto fator de impacto, foi um ensaio clínico levado a cabo para testar a eficácia de dois tipos de dieta mediterrânica, uma suplementada com azeite extravirgem e outra com frutos secos. Tratou-se de um ensaio, multicêntrico, randomizado e controlado feito em Espanha, num período de 5 anos.

Envolveu 7.447 participantes, homens com idade entre 55-80 anos e mulheres com idade entre 60-80 anos, que tinham diabetes tipo 2 ou três ou mais fatores de risco cardiovascular e foram submetidos aleatoriamente a uma de três intervenções: uma dieta mediterrânica suplementada com azeite extravirgem, cerca de 1 litro por semana; uma dieta mediterrânea suplementada com cerca de 30 gramas por dia de uma mistura de frutos secos (15 gramas de nozes, 7,5 gramas de amêndoas e 7,5 gramas de avelãs); ou uma dieta controlo, consistindo num aconselhamento para reduzir a gordura dietética de todas as fontes. Não foi promovida qualquer restrição energética nem atividade física.

Em ambos os grupos que utilizaram uma dieta mediterrânica suplementada por azeite ou frutos secos obtiveram-se extraordinários benefícios, de forma consistente e de magnitude sobreponível à conseguida com alguns fármacos utilizados correntemente na prevenção cardiovascular. Assim, reduziu-se o risco cardiovascular em cerca de 30% em 5 anos (39% de redução de acidentes vasculares cerebrais e 23% de redução de enfartes do miocárdio) e obteve-se 11% de redução na mortalidade global.

O efeito de uma dieta mediterrânica com alto teor de gordura no peso e perímetro abdominal foram também avaliados como objetivos secundários. No início do estudo 90% dos participantes era obeso ou tinha excesso de peso, cerca de 64% dos participantes tinham síndrome metabólico, tendo este revertido em 28% ao fim de 5 anos. Estes dados são muito interessantes, e importa divulgá-los, uma vez que as dietas com alto teor de gordura estão tradicionalmente associadas a aumento do peso corporal, podendo haver alguma relutância da parte dos profissionais de saúde em recomendarem as dietas em questão a indivíduos com excesso de peso ou obesos.

A associação inversa entre o consumo de azeite extravirgem, nozes, amêndoas e avelãs e as doenças cardiovasculares pode ser explicada por vários mecanismos. Os efeitos benéficos são principalmente atribuídos ao alto teor de ácidos gordos monoinsaturados (MUFAs), que são menos suscetíveis a oxidação do que outro tipo de ácidos gordos, mas também a outros componentes com propriedades biológicas importantes, tais como compostos fenólicos, vitamina E e outras moléculas lipoderivadas (esqualeno, tocoferóis, terpénicos, álcoois) que existem especialmente no azeite extravirgem.

Evidências sugerem que o azeite tem propriedades anti-inflamatórias e efeitos anti-aterogénicos, podendo também desempenhar um papel benéfico na redução do stress oxidativo e melhorando a função endotelial. Além disso, tem-se observado que o azeite extravirgem, particularmente no contexto de uma dieta mediterrânica, melhora o perfil lipídico, a sensibilidade à insulina, o controlo glicémico, diminuiu pressão arterial e novos casos de diabetes mellitus.

A adesão a longo prazo a uma dieta mediterrânea irrestrita em energia e suplementada com azeite extravirgem ou nozes ricas em gordura monoinsaturada e componentes bioativos antioxidantes poderá então vir a ser uma ferramenta útil no tratamento da síndrome metabólica entre os indivíduos com alto risco cardiovascular, especialmente naqueles com obesidade central e hiperglicemia ou diabetes franca.

Teresa Passos da Fonseca,

Secretária-Adjunta Zona Sul da SPH