Moçambique enfrenta uma crise alimentar “profundamente preocupante”, com uma estimativa de que o número de pessoas em fases de crise ou emergência alimentar chegue a três milhões durante este ano, destacou um relatório hoje publicado.
O relatório apresentado na Organização das Nações Unidas (ONU) foi produzido pela Rede Global Contra as Crises Alimentares (GNAFC, na sigla em inglês).
O documento indica que entre outubro e dezembro de 2020, já se contavam cerca de 2,4 milhões de pessoas em crise alimentar e 310 mil pessoas em emergência alimentar em Moçambique.
A emergência alimentar – ou fase 4 na classificação universal da insegurança alimentar aguda – é a segunda mais elevada da escala, sendo que a fase 5 representa situações de catástrofe.
As estimativas da GNAFC é que o número de pessoas em necessidade de assistência alimentar urgente em Moçambique aumente com mais 250 mil.
Segundo o estudo, durante 2020, a insegurança alimentar aguda foi pior nos distritos do leste da província de Cabo Delgado, províncias de Gaza e Inhambane, sul da província de Tete e um distrito na região de Maputo, todos classificados em situação de crise, ou fase 3 da escala universal de classificação da insegurança alimentar.
“A escalada do conflito em Cabo Delgado desde o início de 2020, assim como o conflito em Manica e Sofala, levaram a deslocamentos massivos, com os deslocados internos perdendo o acesso a alimentos típicos, fontes de rendimento e terras agrícolas”, lê-se no relatório.
Cabo Delgado foi assim, “de longe”, a província com maior número de pessoas em crise alimentar ou pior, acumulando quase 580 mil pessoas nessa situação e mais de metade do total nacional de 310 mil pessoas em fase de emergência alimentar.
As Nações Unidas estimam que a situação piore em Cabo Delgado durante 2021: “A situação vai continuar a deteriorar-se, estimando-se que 769 mil pessoas estejam em crise alimentar ou pior, principalmente devido ao conflito”.
“O impacto devastador de ciclones frequentes, juntamente com os efeitos da recente seca, conflito, acesso abaixo do ideal a cuidados de saúde e más condições de vida têm produzido vários desafios de nutrição e saúde”, descreveu a GNAFC.
O relatório acrescenta que “extremos climáticos, a destruição subsequente de infraestrutura de água e saneamento, conflitos e deslocamentos em massa contribuíram para surtos recentes de doenças”.
As estimativas apontam que “a depreciação da moeda venha a exercer maior pressão sobre os preços dos produtos” durante a prevista diminuição da produção local e aumento de importações.
“De abril a setembro, espera-se que a insegurança alimentar aguda melhore nas áreas rurais, à medida que as famílias consigam alimentos da sua própria produção e os preços dos alimentos se estabilizem”, concluiu o relatório.
De acordo com estimativas feitas no início de dezembro pelo Banco Mundial, cerca de 120 mil empregos em Moçambique foram perdidos devido à pandemia de covid-19.
Moçambique fez parte de um conjunto de 55 países, “escolhidos por consenso” entre 16 parceiros do estudo, por serem países “tradicionais” em análises de crises, onde já existiam problemas e já estavam instalados sistemas de dados, explicou Arif Husain, economista do Programa Alimentar Mundial.
A região do mundo mais afetada pela escassez de alimentos é a África, onde vivem 97,9 milhões de pessoas nesta situação.