O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) indica que cerca de 6,7 milhões de crianças com menos de cinco anos correm o risco de sofrer níveis perigosos de desnutrição este ano devido à pandemia do novo coronavírus.
As conclusões da UNICEF são sustentadas numa análise publicada pela revista cientifica “The Lancet”, na qual vários investigadores alertaram para as consequências da pandemia da covid-19 na alimentação das crianças e para as potenciais carências alimentares. A análise destes investigadores abrangeu um conjunto de 118 países de baixo e médio rendimento.
“O impacto profundo da pandemia da covid-19 na nutrição das crianças mais novas poderá vir a ter consequências intergeracionais”, declararam os investigadores no artigo publicado na revista, advertindo que tal situação poderá prejudicar “o crescimento e o desenvolvimento dessas crianças”.
Opinião, também ela sustentada pela UNICEF.
“Faz sete meses desde que os primeiros casos da covid-19 foram relatados e é cada vez mais claro que as repercussões da pandemia estão a prejudicar as crianças mais do que a própria doença”, afirmou, em comunicado, a diretora executiva da UNICEF, Henrietta Fore.
Sobre este assunto, a responsável acrescenta ainda que “a pobreza e a insegurança alimentar aumentaram. Os serviços essenciais e as cadeias de abastecimento de alimentos foram interrompidos. Os preços dos alimentos dispararam. O resultado é que a qualidade dos regimes alimentares das crianças diminuiu e as taxas de desnutrição vão aumentar”.
“Como resultado, a qualidade da dieta das crianças piorou e a taxa de desnutrição aumentará”, afirmou Henrietta Fore
A publicação fala ainda de um possível aumento do desperdício, uma forma de desnutrição que põe em risco a vida das crianças, deixando-as muito magras e fracas, explicando que “desperdiçar não só pode causar a morte, mas também causa deficiências no crescimento, desenvolvimento e aprendizagem”.
Segundo a UNICEF são cerca de 47 milhões de crianças que, em 2019, sofreram com este problema, e alerta que este número poderá chegar aos 54 milhões este ano, se não forem realizadas nenhumas ações.
Na análise publicada, os peritos defendem que a crise alimentar causada pela pandemia da covid-19 poderá aumentar em 14,3% a prevalência de perda de peso moderada ou grave em crianças com menos de 5 anos de idade. O que se traduz em mais de dez mil mortes infantis por mês, mais de 50% delas na África subsaariana e no sul da Ásia, onde vivem 80% das crianças em risco, indica a UNICEF.
O agravamento da dieta e a interrupção dos serviços de nutrição são outras razões que vão piorar outras formas de desnutrição em crianças e mulheres, como é o caso do nanismo, da deficiência de micronutrientes, do sobrepeso e da obesidade.
A UNICEF indica ainda que nos primeiros meses da pandemia houve uma redução geral de 30% na cobertura de serviços vitais de nutrição, com alguns países a registarem uma interrupção muito maior.
Outro dos casos apontados pela UNICEF tem a ver com o medo de contágio e a falta de equipamento de proteção para os profissionais de saúde. Por exemplo, no Haiti, estes receios levaram a uma redução estimada de 73% nos internamentos para tratar subnutrição grave em crianças.
A UNICEF chama ainda a atenção para os mais de 250 milhões de crianças, em todo o mundo, que não estão a receber suplementos de vitamina A, devido à covid-19.
Na carta aberta igualmente publicada pela revista “The Lancet”, a UNICEF, a OMS (Organização Mundial da Saúde), a PAM (Programa Alimentar Mundial) e a FAO (Fundo da ONU para a Alimentação e a Agricultura), apelam para “uma ação imediata”.
“Precisamos de pôr em prática ações e investimentos substanciais para a nutrição, de forma a enfrentar a crise da covid-19 e as suas repercussões na fome e na desnutrição infantil”, defenderam as agências da ONU.
Estas agências estimam que serão necessários 2,4 mil milhões de dólares (cerca de dois mil milhões de euros) para conseguir os meios necessários para proteger as crianças que se encontram em situações mais vulneráveis.