Os cuidados de saúde femininos atingem um ponto de inflexão à medida que o investimento em FemTech aumenta: os cuidados passam a ser híbridos e uma abundância de dados permite melhorar os diagnósticos e resultados das doentes. A ascensão da FemTech (cuidados de saúde direcionados para as mulheres) não só beneficiará todas as mulheres, como também beneficiará todo o sistema de saúde.
Os cuidados de saúde femininos não são um nicho de mercado. Só nos Estados Unidos da América (EUA), as mulheres gastam mais de 500 mil milhões de dólares por ano em cuidados de saúde. Representam 50% da população e são responsáveis por 80% das decisões de consumo de cuidados de saúde. No entanto, a base da medicina moderna tem sido, por defeito, masculina. Só com a Lei de Revitalização dos NIH de 1993 é que as mulheres nos EUA foram incluídas na investigação clínica. Necessidades comuns, como os cuidados menstruais e o tratamento da menopausa, têm sido historicamente tratadas como tabu e, devido ao facto de as mulheres terem sido excluídas dos ensaios e da investigação, os respetivos resultados têm sido normalmente piores do que os dos homens. Em média, as mulheres são diagnosticadas mais tarde do que os homens para muitas doenças, sendo que têm 50% mais probabilidades de serem mal diagnosticadas após um ataque cardíaco. Talvez o exemplo mais flagrante das desigualdades seja o dos medicamentos sujeitos a receita médica, em que as mulheres registam efeitos secundários adversos em percentagens mais elevadas do que os homens. Embora estas estatísticas pareçam preocupantes à primeira vista, o investimento nos cuidados de saúde femininos está a aumentar, com a ajuda das tecnologias de cloud computing e de um maior acesso aos dados.
Só no último ano, o financiamento de empresas FemTech aumentou 197%. Com o aumento do acesso ao capital, tecnologias como o machine learning e dispositivos de conexão projetados especificamente para mulheres estão a originar resultados incríveis, não apenas na forma como os cuidados com as mulheres são percebidos, mas também como são administrados. Empresas como a Tia, a Elvie e a Embr Labs estão a mostrar o enorme potencial da utilização de dados e da análise preditiva para prestar cuidados individualizados e ir ao encontro das doentes onde elas se sentem confortáveis – em casa e `em movimento´.
À medida que o estigma se dissipa em torno das necessidades de saúde das mulheres e que mais financiamento flui para este setor, iremos continuar a assistir a empresas FemTech a liderarem fortemente este processo de mudança. Ao mesmo tempo, o acesso das mulheres aos serviços de saúde aumentará drasticamente graças aos modelos de cuidados híbridos que tiram partido das plataformas médicas online, da disponibilidade de dispositivos de diagnóstico de baixo custo e do acesso a profissionais médicos a pedido. Clientes como a Maven provaram ser líderes neste espaço, esbatendo as fronteiras entre a saúde mental e o bem-estar físico e fornecendo tudo, desde aconselhamento sobre relações a cuidados na menopausa. À medida que estas plataformas amadurecem e proliferam, vamos assistir à democratização do acesso aos cuidados de saúde. As mulheres das zonas rurais e das regiões historicamente mal servidas terão mais facilidade em ligar-se a ginecologistas obstetras, profissionais de saúde mental e outros especialistas através de aplicações e plataformas de telesaúde. Os sistemas de tampões inteligentes, como o que a NextGen Jane está a desenvolver, permitirão que as mulheres estabeleçam perfis da sua saúde uterina e identifiquem potenciais marcadores genómicos de doenças, que podem ser facilmente partilhados com os médicos. Além disso, os dispositivos portáteis fornecerão aos utilizadores e aos médicos uma grande quantidade de dados de saúde que podem ser analisados. Atualmente, mais de 70% das mulheres não recebem tratamento para os sintomas da menopausa. O aumento da educação, a disponibilidade de dados e as soluções não invasivas irão melhorar drasticamente os resultados – e isto vai muito além dos cuidados obstetrícios e ginecológicos.
Por exemplo, no período que antecedeu o Campeonato do Mundo de Futebol Feminino, cerca de 30 atletas sofreram lesões do ligamento cruzado do joelho. Tal como acontece com a medicina tradicional, o treino das mulheres foi formatado com base no que funcionava para os homens, sem ter muito em conta a fisiologia. Como resultado, as mulheres têm seis vezes mais probabilidades de sofrer uma lesão do LCA e 25% menos probabilidades de recuperar totalmente e regressar aos relvados. Esta é outra área em que a compreensão de dados de saúde únicos terá um impacto, não só para prevenir lesões, mas também para melhorar a saúde das mulheres atletas de uma forma holística.
Estamos num ponto de viragem para os cuidados de saúde das mulheres. O acesso a uma abundância de dados diversificados, associado a tecnologias de cloud computing, tais como a visão por computador e a aprendizagem profunda, irá reduzir os erros de diagnóstico e ajudar a minimizar os efeitos secundários da medicação que afeta desproporcionadamente as mulheres de hoje. A endometriose e a depressão pós-parto receberão a atenção que merecem por direito. Veremos finalmente os cuidados das mulheres passarem da periferia para a linha da frente. Uma vez que as equipas lideradas por mulheres são mais propensas a resolver um vasto leque de problemas de saúde, do que as constituídas apenas por homens, veremos que a FemTech não só beneficiará as pessoas que se identificam como mulheres, como também melhorará todo o sistema de saúde.