Bisfenol A – um desafio para a Saúde Pública 466

A indústria tem desenvolvido inúmeros tipos de embalagens de forma a garantir a qualidade e segurança dos produtos alimentares em toda a cadeia de distribuição até chegar ao consumidor. Com diferentes formas e materiais, desde vidro, metal, papel ou plástico, várias são as opções, algumas mais saudáveis, sustentáveis e inovadoras do que outras. As de plástico tem assumido uma larga utilização, mas nem todos os plásticos são iguais.

Os fabricantes utilizam uma variedade de diferentes compostos, cada um com propriedades especificas. Nos últimos tempos muito se tem falado das embalagens de plástico à base de policarbonato e resinas epóxi que têm um composto químico conhecido como Bisfenol A (BPA). Mas o que é exatamente o BPA, e por que tem gerado tanta polémica?

O Que é o Bisfenol A?

Utilizado na produção de resinas epóxi e embalagens de policarbonato desde 1957 é um composto químico orgânico que confere aos materiais plásticos durabilidade, transparência e resistência ao calor. Desde embalagens alimentares, a equipamentos e dispositivos médicos, passando pelo papel que sai das caixas registadoras, das impressoras ou dos terminais bancários é um composto com uma elevada produção anual, superior a 7 milhões de toneladas, em 2022. Para termos uma noção deste valor, corresponde a “70 vezes o peso do Monte Everest ou a 700 Torre Eiffel”!

Impactos na Saúde

Sendo um disruptor endócrino, o BPA pode interferir no sistema hormonal do ser humano. Segundo o último relatório da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA), de 2023, a exposição ao BPA pode causar problemas no sistema reprodutor, no desenvolvimento do feto durante a gravidez, bem como aumentar o risco de doenças metabólicas, cardiovasculares, de cancro da mama e da próstata.

Devido à crescente preocupação com a exposição da população ao BPA, a indústria tem procurado alternativas, como por exemplo a utilização do Bisfenol S e o Bisfenol F. Contudo, ainda persistem algumas dúvidas sobre os efeitos destes na saúde humana.

Exposição e Regulamentação

A dieta é a principal fonte de exposição ao BPA em todos os grupos populacionais. O contacto com o BPA pode ocorrer de diversas formas, sendo a mais comum a exposição alimentar, pela ingestão de alimentos armazenados em recipientes plásticos ou enlatados ou bebidas em garrafas de plástico. Esta via de exposição é a mais preocupante, uma vez que pode afetar um maior número de pessoas e porque, neste caso, a exposição pode ocorrer durante longos períodos com doses vestigiais e sem ser detetada.

As embalagens alimentares são controladas por diversos regulamentos europeus, entre os quais a Decisão da Comissão 97/129/CE, que estabelece o sistema de identificação dos materiais de embalagem. Neste sistema, os materiais plásticos são classificados com uma numeração de 1 a 19. Este código pode ser facilmente encontrado nas embalagens alimentares, num triangulo formado por setas com o número correspondente no centro. As embalagens alimentares que podem conter BPA são as de policloreto de vinil (PVC), codificadas com o número 3, e as embalagens codificadas com o número 7, que simboliza “outros” (embalagens fabricadas com outro tipo de plástico não indicados nos números anteriores).

As resinas epóxi são utilizadas no revestimento interno das latas de conserva a fim de evitar o contacto dos alimentos com o metal, evitando assim a corrosão da lata. Apesar de não existir uma sinalética obrigatória a indicar a presença de BPA, a maioria destas resinas, presentes nos enlatados, têm BPA ou compostos análogos.

Como tal, há sempre a possibilidade da migração do BPA para os alimentos embalados, especialmente quando utilizamos as mesmas para fins não indicados pelo fabricante ou quando a embalagem/lata está danificada.

A União Europeia tem vindo a limitar cada vez mais a utilização deste composto na produção de plásticos. Com a atualização do Regulamento (UE) n.º 10/2011, em 2018, o Limite de Migração deste composto para alimentos ou simuladores alimentares diminuiu de 0,6 mg/kg para 0,05 mg/kg de alimento. Este Regulamento tem por fim estabelecer os limites de migração máximos para várias substâncias, a partir de embalagens alimentares. Atualmente, a utilização de BPA é proibida na União Europeia no fabrico de biberões, garrafas ou copos de policarbonato destinadas a lactentes (bebés e crianças pequenas), pela Diretiva 2011/8/UE.

Como se pode minimizar a exposição ao BPA?

Existem várias medidas que se podem adotar para reduzir a exposição a este composto:

  • Escolher produtos marcados “Sem BPA” ou “BPA free”.
  • Utilizar recipientes de vidro, cerâmica e/ou plásticos próprios, como por exemplo o polipropileno (número 5), polietileno de baixa e alta densidade (números 4 e 2), para aquecer alimentos e bebidas no micro-ondas.
  • Preferir vidro para armazenar alimentos e bebidas.
  • Reduzir o consumo de alimentos enlatados, optando por alimentos frescos ou congelados.
  • Seguir as instruções de utilização das embalagens/latas de conserva do fabricante.

Para reduzir a exposição ao este composto cada um tem a sua parte a desempenhar: o cidadão adotando práticas alimentares mais seguras; as autoridades legislando e fiscalizando; e os cientistas investigando, designadamente na área de novas embalagens mais saudáveis e sustentáveis. No Departamento de Alimentação e Nutrição, do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, as embalagens alimentares inovadoras é um tema que tem ocupado parte da nossa investigação, no sentido de obter soluções que caminhem para mais saúde da população e do planeta.

 

Mariana Alvoco Andrade
Laboratório de Química do Departamento de Alimentação e Nutrição do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge