O trato gastrointestinal humano é colonizado por diversos microrganismos e é no cólon que reside a comunidade mais densa e com mais diversidade: o microbiota intestinal. O microbiota intestinal, enquanto ecossistema em equilíbrio, interage com o organismo hospedeiro, desempenhando diversas funções metabólicas. A translocação de bactérias e/ou dos seus componentes (como o lipopolissacarídeo, LPS, que está presente na membrana exterior das bactérias gram-negativas) pode ativar uma resposta inflamatória que, quando continuada, não resolvida, poderá dar origem a doenças metabólicas crónicas como a diabetes tipo 2. Uma barreira intestinal íntegra é, por isso, crucial para impedir a translocação paracelular de componentes bacterianos. No entanto, são vários os fatores que podem alterar a permeabilidade do intestino. Uma alimentação rica em gordura, sobretudo em gordura saturada, provoca alterações profundas no microbiota intestinal ao mesmo tempo que altera a expressão de proteínas que sustentam as junções apertadas das células intestinais. Um dos mecanismos propostos para este efeito deletério na integridade da barreira intestinal é o facto de uma alimentação rica em gordura estimular a secreção de ácidos biliares a nível hepático. Ao serem libertados no intestino, os ácidos biliares primários são transformados, por ação do microbiota, em ácidos biliares secundários. Estudos recentes demonstraram que o ácido desoxicólico, um ácido biliar secundário, quando presente em concentrações elevadas (iguais às encontradas numa alimentação rica em gordura) induziu modificações na estrutura do tecido epitelial, uma vez que, sendo um surfactante, tem a capacidade de romper a bicamada lipídica das membranas celulares. Outro exemplo de compostos com capacidade de provocar uma disfunção da barreira intestinal são os emulsionantes. Para explorar os efeitos de agentes emulsionantes na mucosa intestinal, Chassaing e colaboradores administraram, em ratinhos, carboximetilcelulose (E466) e polisorbato 80 (E433), emulsionantes habitualmente utilizados em alimentos para consumo humano, em doses consideradas seguras pela EFSA. Este estudo demonstrou que os animais expostos aos emulsionantes apresentavam uma redução da espessura da camada de muco que protege o epitélio e um aumento da permeabilidade intestinal. Para além disso, as bactérias intestinais destes animais conseguiram penetrar de forma mais profunda na camada de muco, predispondo estes animais ao desenvolvimento de síndrome metabólica. Estes dados, levantam outras questões, como o uso de ácido perfluorooctanóico (PFOA), também este um surfactante, utilizado como aditivo no processo de fabrico de alguns revestimentos antiaderentes de utensílios de cozinha e que poderá, durante o processo de confeção, migrar e contaminar o alimento. Apesar de alguns estudos necessitarem ainda de validação em humanos, como nutricionistas, não podemos deixar de olhar para os aditivos alimentares e para alguns contaminantes como possíveis disruptores da função da barreira intestinal, com todas as consequências que daí advêm, reforçando-se assim a importância de promover uma alimentação saudável, limitando o consumo de alimentos processados e ricos em gordura saturada. Cláudia Marques, |