A desregulação do metabolismo energético é uma das características das células do cancro que tem despertado grande interesse em grupos de investigação que estudam os enigmas das células tumorais. Neste sentido, explorar o metabolismo das células tumorais tem surgido como um desafio a nível da terapêutica do cancro. Uma característica comum a todos os organismos vivos é a necessidade de energia. Para que ocorra produção de energia, universalmente conhecida como ATP, as células usam várias fontes que lhes servem de combustível, incluindo a glicose, os aminoácidos e os lípidos. Essa produção de energia é essencial para suportar a função e a proliferação celular. Todos os eucariotas, desde as leveduras até aos seres humanos, geram ATP através da glicólise e da fosforilação oxidativa. De um modo simplista, na via glicolítica ocorre a divisão da glicose (açúcar) para produzir ATP, já na fosforilação oxidativa ocorre a combinação de fosfato inorgânico com ADP para formar ATP, na presença de oxigénio. Em condições aeróbicas, as células não tumorais (normais) metabolizam a glicose a piruvato, através da glicólise e completam o catabolismo da glicose na mitocôndria, produzindo CO2. Por outro lado, quando o oxigénio é limitante, as células podem redirecionar o piruvato gerado pela glicólise para a produção de lactato. Esta geração de lactato, durante a glicólise anaeróbica, permite manter a produção de energia. Nos anos 20, Otto Warburg, verificou que as células tumorais, independentemente da presença ou ausência de oxigénio, preferem metabolizar a glicose através da fermentação láctica, em detrimento da fosforilação oxidativa, levando a uma maior produção de lactato. Assim, a reprogramação do metabolismo da glicose pelas células tumorais, levam a um estado que tem sido denominado de “glicólise aeróbica” (efeito de Warburg). Nesta situação a produção de energia (ATP) é menor. Por isto, a maioria dos tumores humanos apresentam um fluxo de glicose significativamente mais elevado comparativamente aos tecidos não tumorais (normais), mantendo-se uma fonte contínua de glicose, tornando esta glicólise em meio aeróbico eficiente para sustentar a elevada proliferação celular. Esta troca metabólica proporciona vantagens a nível da invasão das células tumorais, o aumento da produção de ácido láctico e a consequente acidificação do meio envolvente, ativa vias facilitadoras da invasão, permitindo-lhes danificar os tecidos normais circundantes. Mais, as células tumorais desenvolvem resistência à toxicidade induzida pelo ácido durante a tumorigénese. Por outro lado, este microambiente acídico nos tecidos normais peritumorais conduz a toxicidade de células não tumorais vizinhas. Assim, estratégias terapêuticas capazes de interferir na regulação metabólica das células tumorais, como por exemplo, a inibição na captação de glicose pelas células tumorais ou a inibição de enzimas-chave intermediárias da glicólise, permitiriam contrariar a proliferação celular ilimitada dos tumores, suportada pelo aumento da glicólise aeróbica. Ainda polémica é a vantagem de dietas cetogénicas em doentes oncológicos, sustentadas no princípio da privação de glicose às células tumorais. Note-se que a privação será para todas as células e não apenas para essas. Vale a pena o Nutricionista pensar nisto… Sónia Norberto, |