Ano Novo, Velhas Utopias 1360

Janeiro é mês de resoluções de ano novo, ponto de partida para mudanças positivas e época de esperança num futuro melhor! Depois dos excessos natalícios, depois de mais um ano em que nada mudou (ou piorou, até), janeiro traz a expectativa de que “agora é que vai ser”! De facto, perder peso está sempre no top 5 das resoluções de ano novo. E se é fácil perceber porque tanta gente quer emagrecer, mais difícil parece ser entender porque continuam a não conseguir…

Suponho que uma das razões seja a abordagem dominante à perda de peso e a uma alimentação saudável. Comer verduras, cortar nas carnes, fugir do sal e dos açúcares, cuidado com as gorduras… Sendo tecnicamente válido, não é cativante nem motivador na forma como é apresentado. Como garantir a adesão a padrões alimentares mais equilibrados, no médio-longo prazo, se a solução apresentada consiste apenas em retirar opções de que se gosta ou a que fomos habituados, sem oferecer nada em troca no curto prazo? Recentemente, deparei-me com duas situações que talvez apontem para as respostas que procuramos.

1) Num centro comercial, uma longa fila de gente à porta de uma cadeia de comida rápida que chegou a Portugal. Porque estariam todas aquelas pessoas dispostas a esperar em pé mais de 30 minutos para fazer a sua refeição. Pela novidade? Bem, há vários novos restaurantes e a realidade é a oposta – estão vazios, porque ninguém os conhece. Pelo preço? Havia ao lado vários restaurantes de serviço rápido igualmente baratos, sem fila. Porque aceitam o “sacrifício” de esperar para comer ali? Que expectativas alimentam aquelas pessoas e como foram criadas? Numa altura em que nos esforçamos por promover a dieta mediterrânica, não deixa de ser interessante refletir sobre os ensinamentos que o setor da restauração nos pode deixar para cativar o interesse da população.

2) A DGS lançou em novembro uma campanha com vista à promoção de melhores hábitos alimentares, em particular junto da população adulta mais jovem. Com uma vasta presença em diferentes suportes (spots de TV e rádio, cartazes em MUPIs e transportes públicos, redes sociais), seria curioso saber quais os níveis de recordação destes anúncios – quantos se recordam de os ter visto e quais as mensagens de que se lembram? Num ambiente saturado de publicidade, de quantos anúncios ou campanhas nos conseguimos recordar? São, seguramente, desafios que a indústria alimentar e a grande distribuição estão habituadas a encarar. Que lições nos poderão dar sobre publicidade, seus objetivos concretos e formas válidas de os medir?

Estes exemplos parecem indicar que os profissionais de saúde, e os de nutrição em particular, temos muito a aprender com especialistas das áreas da comunicação e marketing do setor alimentar (indústria, restauração, distribuição). Não custa admitir que, se queremos de facto populações mais saudáveis, temos de trabalhar em conjunto com estes stakeholders, somando conhecimentos e experiências. Os ideais nostálgicos e bucólicos em torno da alimentação (“antigamente é que era bom”, porque cultivávamos a nossa comida e tínhamos tempo para cozinhar) ignoraram completamente a realidade atual e insistem em soluções utópicas, que as pessoas dificilmente conseguirão seguir.

Com uma nova década pela frente, será que é desta que vamos acertar no caminho para a redução da obesidade?

Rodrigo Abreu
Nutricionista – Managing Partner na Rodrigo Abreu & Associados
Fundador do Atelier de Nutrição