A Ordem dos Nutricionistas associou-se às comemorações do Dia Mundial da Saúde de 2022, da Organização Mundial da Saúde (OMS), com a realização de uma conferência sob o mote “Our planet. Our health”, tema definido pela OMS para celebrar este dia.
A iniciativa contou com a apresentação dos dados do estudo “Integração dos Nutricionistas no Serviço Nacional de Saúde”, onde se constatou que continua a registar-se uma assinalável lacuna de nutricionistas no SNS.
Luís Filipe Amaro, do Observatório da Ordem dos Nutricionistas, sublinhou que o estudo indica que seriam necessários mais cerca de 800 nutricionistas para dar cobertura às políticas de equidade em Saúde – algo que já está plasmado em lei, mas que continua bem longe das necessidades reais das populações. Mais: estas quase 8 centenas de profissionais em falta correspondem ao dobro dos que já trabalham nos hospitais e sete vezes mais daqueles que se encontram nos Cuidados de Saúde Primários (CSP).
O responsável refere que há um nutricionista para cerca de 100 mil utentes, um número bem aquém daquilo que é defendido pela ON (12 mil utentes por cada profissional). Esta diferença, indica o estudo, faz com que não se esteja a cumprir o despacho governamental (nº6556/2018) em que se pretendia assegurar em todas as instituições do SNS a presença dos nutricionistas, “com particular carência nos agrupamentos de centros de saúde (ACeS) sob administração das ARS”.
«Umas das barreiras que poderá determinar a pouca extensão da formação de núcleos de Nutrição nos CSP é a falta destes profissionais, registando-se a necessidade de, pelo menos, quadruplicar o seu número de imediato, tendo como referência recomendações mais conservadoras. Num cenário considerado adequado para a organização dos CSP em Portugal, o ajustamento ao número médio de utentes revela a necessidade de contratação de 700 nutricionistas». Seriam assim necessários pelos menos sete vezes mais nutricionistas, o que representa um reforço substancial dos recursos humanos do SNS, pese embora a «eficácia comprovada» do investimento nestes profissionais se traduzir em ganhos de Saúde e ganhos económicos, a médio e longo prazos.
Também nos cuidados de saúde hospitalares (CSH) se registam carências na integração de nutricionistas, apesar da situação ser mais positiva, estimando-se que seja necessário contratar, pelo menos, duas vezes mais profissionais face aos existentes.
A bastonária da Ordem dos Nutricionistas salienta que, mesmo com a inclusão de mais profissionais no âmbito do concurso iniciado em 2018, «estima-se um rácio de cerca de 90 mil utentes por nutricionista, o que é claramente desajustado, não garantindo o acesso dos portugueses aos cuidados de Nutrição». Alexandra Bento recorda que a OMS estima que mais de 13 milhões de mortes em todo o mundo, a cada ano, se devem a causas evitáveis, como é o caso dos maus hábitos alimentares, e insiste que é urgente olhar para a Nutrição como uma garantia de prevenção de doença e promoção de saúde.
«Hoje, mais do que nunca, a ON relembra que urge olhar para a Nutrição como uma garantia de uma população portuguesa mais saudável, consequência de uma estratégia focada na prevenção e no tratamento da doença, ao reforçar a presença de nutricionistas no SNS», reitera.
Nos CSH, tendo em conta as recomendações de entre 50 a 75 camas hospitalares para cada nutricionista seriam necessários entre 39 a 141 destes profissionais, mas o estudo conclui que há apenas um nutricionista por cada 89 camas nos cuidados de saúde hospitalares. Apesar das intenções para melhorar o cenário já existirem, o rácio de camas por nutricionista não apresentou diferenças significativas entre 2020 e 2022, ainda que se registem melhorias nas regiões do Alentejo, Lisboa e Vale do Tejo e Norte.
«Refugiados climáticos»
O evento da ON arrancou com a conferência “O nosso planeta, a nossa saúde”, que contou a participação de Sara Cerdas, deputada ao Parlamento Europeu, e a moderação a cargo de Bárbara Beleza, da ON.
A médica e eurodeputada lembrou que urge «tomar medidas» para contrariar a recente teoria de «sindemia», que agrupa os problemas da obesidade, da má nutrição e das alterações climáticas. Sara Cerdas sublinha que «não é possível fechar a Saúde numa bolha», até porque as alterações climáticas já estão a ter reflexos «muito preocupantes» na produção global de alimentos, podendo vir a registar-se um decréscimo de até 50% na produção total da comida no planeta, um dado que põe em risco grande parte da população dos países mais carenciados.
Segundo a eurodeputada, as alterações climáticas produziram já um novo tipo de refugiados: os “refugiados climáticos”, um número indeterminado de pessoas que se veem a braços com a necessidade de abandonar os seus lares para escapar de um futuro incerto, causado pelas alterações climáticas. Sara Cerdas assume que a União Europeia «está muito atenta» a este conjunto de problemas e que esta estrutura transnacional pretende «tornar-se no líder mundial no combate às alterações climáticas».